Diplomacia portuguesa. Questões da política externa. Razões de estado. Motivos de relações internacionais.
07 outubro 2003
Diplomacia de chanceler ou de Primeiro-Ministro e MNE com reticências
Chegou, com especial atenção por Terras do Nunca, o momento das reticências. Ou porque temos tido, de há uns anos a esta parte, Ministros de Negócios Estrangeiros com os três pontinhos fatais para as Necessidades. Deixou de ser o Chefe da Diplomacia.
A autonomia ou responsabilidade política dos Ministros de Negócios Estrangeiros tem vindo a diminuir no sistema governamental. O MNE português cada vez mais é ou tem que ser ou ainda e melhor: tem que garantir ser um prolongamento do Primeiro-Ministro, aceitando o seu controlo de forma muito estreita e continuada. Esta questão esteve na base da «queda» de Deus Pinheiro como MNE (quando Martins da Cruz era assessor diplomático de Cavaco Silva) e só não se repetiu na relação de Gama-Guterres porque Gama foi um «táctico sem estratégia», cedo apercebendo-se de que que não podia utilizar o cadeirão das Necessidades em detrimento do Primeiro-Ministro. Daí que Jaime Gama apenas actuava em matéria de Assuntos Europeus – que é onde as coisas contam, o resto é ética - nas margens daquilo que Guterres não queria fazer. Inteligente como é, Gama conseguiu gerir essa relação imposta, de maneira notável. E o Povo a pensar que tinha MNE e Guterres a pensar que ninguém lhe observava o jogo de chanceler.
Com Durão Barroso, deu-se mais um passo para esse tipo de governo de chanceler, ainda dissimulado mas isso. O Primeiro-Ministro deixou de ser apenas o primus inter pares mas é o Ministro, os ministros são os secretários de Estado e os secretários de Estado não passam de Directores-Gerais. Apesar de, no plano formal, não se revelar publicamente muito influente, o gabinete de Durão Barroso é muito influente tal como foi o de Guterres (cujos ministros pronunciaram cem vezes a palavra lealdade por cada alusão à responsabilidade). Embora a designação de Ministro e, no caso, de MNE, corresponda à função, já não corresponde à responsabilidade política: dizem e fazem o que por lealdade política assumiram fazer. A aceitação de ser MNE está sujeita a estas condições pelo que alguns não foram MNE porque não aceitaram as limitações. O papel de Durão Barroso na demissão do Director-Geral de Política Externa, Silveira de Carvalho, na selecção do seu sucessor, nas nomeações para as principais embaixadas e no controlo da CIG, são os sinais evidentes de que hoje em Portugal há uma «Diplomacia de Primeiro-Ministro», expressão outrora já bem descrita por Marcello Caetano a propósito de governos do tipo de «chanceler». Daí que uma «solução Dias Loureiro» seria demasiado «independente» para o modelo.
MNE, portanto, mas com reticências. O MNE, com rigor, é o Ministro para a África e Comunidades Portuguesas - sendo a Europa o principal é o que lhe escapa. Durão Barroso não faz mais nem menos do que Guterres fez e, por isso, quando o Parlamento escrutina um MNE, já não escrutina o responsável mas tão só um secretário de Estado leal.
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