Nota de reportagem do correspondente-estagiário de NV no Luxemburgo
«Luxemburgo, 13 de Outubro (do correspondente-estagiário de Notas Verbais) - Melhor era impossível ! Teresa Gouveia chega ao seu primeiro CAGRE com o atraso de regra, espalhando um não intencional sorriso de charme que começa por inflamar os contínuos italianos e acaba por atiçar o secretariado do Conselho. A UE já não será mais a mesma. O seu despenteio "négligé" diz bem com o rosto sereno, onde a beleza profunda do tempo se soma à confiança segura de quem sabe ao que vai. Mendonça e Moura, profissional, condu-la, com orgulho pouco contido, ao ministro italiano, que articula banalidades gentis. Solana, tardio mas caloroso, dá-lhe um beijo de peninsular familiaridade e de quem já tem todos os mundos no seu. Cumprida a função protocolar junto da presidência, Teresa regressa sozinha à bancada portuguesa, onde Costa Neves se ficara, embevecido, no seu fato claro, com o micaelense sorriso de quem parece ter-se liberto de uma cruz. Tadeu Soares escrutina, severo, a reacção da sala, Silveira Carvalho sofre a orfandade com um esfíngico sorriso, já transatlântico. Ministros e embaixadores olham-na com uma curiosidade pouco inocente, avisados pelos "cables" adjectivados da suas legações lisboetas. Nas mesas de trás da sala, elas miram com curiosidade, eles com um esticar de pescoço pouco subtil. No seu trajecto, Teresa cruza-se com Ana Palacio, rápida, fria e muda, perdida num despeito estético ibérico, ausente mais em directivas do que em coisas da vida. Do outro lado da mesa, Benita Waldner compõe o lenço Ballenciaga sobre o saia-e-casaco, agita-se à esquerda e à direita, destacando o broche amarelo-azulado à cata de atenção. Debalde. Teresa já reina. Do topo da mesa, Patten larga por momento o "brief", tira os óculos da ponta do nariz e dá-lhe um sorriso largo, do tamanho da muralha da China. Teresa senta-se. Abre o dossier que a Reper lhe preparou com a minúcia tutorial dos primeiros dias. E respira, confiante e segura, como quem diz, de si para si : "vamos a isto!". E foi, nas horas seguintes, de tal forma natural, competente e profissional que arrancou a certa altura um "temos homem!", de um estranho membro da delegação portuguesa, numa distraída barbaridade. Entretanto, poucos notaram um rugido que, pouco a pouco, ouvidos atentos dizem ter emanado em crescendo das entranhas do edifício, um som surdo de dor e de raiva, um indisfarçável rumor de tom lusíada. Não terá, porventura, passado de um equívoco dos que não haviam esquecido a fabulosa "performance" de "A Bela e o Monstro", que o Teatro Novo de Bruxelas trouxera na véspera. À mesma hora do início do CAGRE, às 9 horas de Lisboa, alguns estremunhados funcionários entram nas Necessidades. Recuso-me a acreditar em quem me diz que sorriam.»
NV - Pedimos desculpa aos nossos leitores, mas para a próxima reunião europeia destacaremos um profissional.
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