13 março 2005

E aqui temos Fernanda Leitão... ...com a sua Carta do Canadá

NV admitem que Freitas do Amaral teria toda a conveniência em ler esta Carta, conversar com António Braga sobre o que se destaca a negro e envolve o Consulado de Toronto, Emigrantes Portugueses, teias locais...

CARTA DO CANADÁ
Fernanda Leitão

A VER VAMOS

A vitória eleitoral do Partido Socialista estava garantida pelo facto de, após a queda do império soviético, os povos terem deixado de sentir medo do marxismo e suas possíveis alianças com o leninismo, por um lado, e pela situação de queda na vertical do país ocasionada pela incompetência, corrupção e laxismo dos três últimos governos, por outro lado. A massiva derrota nas urnas da direita não significa que o eleitorado se tenha todo convertido à esquerda, mas sim ao pragmatismo saudável que os eleitorados maduros já praticam em vários países. O Canadá é um deles. O equivalente ao PS, no xadrez canadiano, é o Partido Liberal, em que votam as grandes massas de emigrantes, ou seja, de trabalhadores. O PSD equivale ao Partido Conservador, esse que, depois da época dourada dos líderes carismáticos e prestigiados, averbou uma derrota histórica, por exclusiva culpa do mau governo de Brian Mulroney, de que nunca mais se recompôs. O resto são franjas partidárias sem expressão. Os canadianos, confortados com a chefia do estado pela Raínha Isabel de Inglaterra, votam num ou noutro partido conforme a conjuntura nacional e as aneiras averbadas pelos governos em exercício. Fazem-no sem estados de alma nem complexos, contando à partida com a tranquilidade de um país que funciona sempre nas suas estruturas básicas porque a sua administração pública não está partidarizada. Os governos alternam-se, mas não há a dança grotesca dos saneamentos, da colocação de boys partidários, da instalação de parentes, aderentes e compadres, na função pública. Este pormenor faz toda a diferença entre uma democracia madura, responsável e limpa, e outras que, ao fim de 30 anos de prática, continuam a reger-se por critérios de “confiança política” e não de competência. Espera-se que o novo governo de Portugal represente uma nova mentalidade, uma nova era.

Pessoalmente, acho positivo que não se tenham registado ruidosas celebrações da vitória, prova de que o eleitorado aprendeu a ser contido, a esperar para ver; que o PC ocupe o terceiro lugar, em vez do BE, porque a população quer é o capitalismo selvagem vigiado pelos sindicatos, em vez de tronitruantes campanhas à roda do aborto, droga e eutanásia feitas por meninos ricos e bem instalados na vida, isto é, meninos que não têm nada que fazer; que o governo seja composto por independentes e socialistas em número igual.

O lado negativo, para mim, foi o horrendo mau perder do PSD e do CDS, em que os respectivos líderes acabaram por se classificar por inteiro perante o povo como lídimos retratos vivos da baixaria. E last but not least, a composição da actual secretaria de estado das Comunidades.

Estamos perante uma equipa de quem não se espera nada de positivo, concreto e eficiente, sendo a única esperança dos emigrantes o ministro dos Negócios Estrangeiros, que tutela essa secretaria de estado. Freitas do Amaral terá outros defeitos, mas não é incompetente nem corrupto e, por conseguinte, não tolerará incompetências e corrupções. Tudo reside em ele estar informado do que, de facto, se tem passado e se passa nos consulados, nas embaixadas, nas associações comunitárias, nos arraiais dos deputados pela emigração, nos leitorados de Português a cargo do Instituto Camões, no modo como os coordenadores do ensino de Português são hostilizados, ao menos veladamente, e sobretudo se são competentes e isentos, por agentes diplomáticos servindo obscuros interesses ou grosseiras falhas de profissionalismo e de carácter.

No caso concreto de Toronto, urge apurar em profundidade a misteriosa razão por que dirigentes de associações de clubes e correspondentes da agência noticiosa estatal defendem ardorosamente, ainda nos dias que correm, o antigo cônsul Artur Magalhães, esse a quem os que estão por dentro da teia chamam “um artista português”. Saber porque chamam A CAPA a uma associação e o que siginificam 10 mil dólares de uma vez e 45 mil da outra, à pala de Camões; por que diabo um secretário de estado andava em promessas a um cônsul que já se via cabeça de lista pelo PSD Fora da Emigração ou presidente da câmara de Viseu; que significa o Clube da Moeda onde o tal cônsul treinava noites inteiras em libações para o desenlace de estrada que protagonizou com a polícia canadiana; que empregado do consulado estará de baixa (ao que se diz fraudulenta) vai para dois anos; porque é que chegam a estar de baixa ou de férias, ao mesmo tempo, metade dos funcionários do consulado; porque é um antigo cônsul apoiou abusivamente a recusa de um funcionário prestar serviço consular temporário no estrangeiro e porque é que esse funcionário berra horas inteiras e insulta colegas de serviço, na maior impunidade; porque é que a dirigente sindical passa a maior parte do tempo em Lisboa e exige documentos disparatados a quem requer passaportes no pouco tempo que passa no consulado; porque é que, em consulados anteriores, as requisições de vinho através do consulado atingiram níveis inaceitáveis; porque é que emigrantes ilegais portugueses têm estado a ser deportados sem que as nossas autoridades recebam o aviso prévio, por inépcia e desleixo do funcionário a quem tal incumbe, avançando-se o número de 400 deportados; que se tem passado, realmente, nos últimos 15 anos, nos sectores de melindre que são a oficialização de escolas privadas de Português e o recenseamento eleitoral e, finalmente, os “consulados honorários”, concebidos e paridos por José Cesário, um deles funcionando, desconchavadamente, dentro de uma igreja graças a um padre que é, também ele, “um artista português”.

Não sendo a comunidade portuguesa do Canadá uma excepção, é legítimo multiplicar este quadro por n vezes. E assim sendo, fácil é concluir que o ministro Freitas do Amaral tem diante de si uma enorme e urgente tarefa: devolver às comunidades a dignidade e o bom nome a que têm direito, limpando de vez toda esta sujeira. E, o que não é de somenos, acabando com a injustiça de pôr as comunidades a pensar que embaixadores e cônsules, mailos respectivos funcionários, é tudo uma tralha. Em Toronto, provisoriamente, depois da saída do ex-cônsul Magalhães por exigência da polícia canadiana, está um diplomata honesto, competente, digno e discreto: Veiga Domingos. Mesmo estando aqui há pouco tempo e por pouco tempo, não merece ser misturado, ao menos em termos de imagem pública, com a fruta pôdre que, depois do nunca esquecido cônsul António Montenegro, atravancou o consulado de Portugal em Toronto. E no mesmo consulado, há alguns funcionários exemplares.

A ver vamos, se entra ordem na desordem.

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