Cravos. Tem toda a razão, meu caro. Recorda-me você que há uma altura do ano, próximo do São Martinho em que muitos dos diplomatas ingleses que andam pelo mundo começam a aparecer com uma pequena flor vermelha na lapela, a papoila vermelha vendida pelas ligas de veteranos e que celebra o Armísticio de 1918. E como comprovado observador que você é, também notou que quem passa os olhos sãos pela Sky News ou pela BBC também apanha com um ou outro locutor ou entrevistado com a dita papoila. Caminha para cem anos e os ingleses não têm vergonha dessa flor. Pelo contrário, transforma-na em instituição.
Estive para lhe dar troco. Devia-o ter feito. Como saberá, em Portugal, os poderes do Estado que são muito dados à floricultura - aliás a governação é sempre um caso de floricultura - tais poderes têm todavia vergonha das flores. É claro que em 11 de Novembro de 1918, nem sequer a mensagem calorosa do rei Jorge V sobre o armistício continha adubo suficiente para plantar uma papoila no peito do destinatário português, o Presidente Sidónio Pais. E a papoila não vingou como insígnia muito menos como símbolo. Pelos acontecimentos do mês seguinte desse mesmo ano (tentativa abortada de assassinato em 5 de Dezembro e tiro fatal a 14) ficou omisso na nossa história se Sidónio teve vergonha da papoila ou se tinha outra ideia para a floricultura da Pátria.
E pergunta-me você que distância irá da papoila ao cravo? Ora faz muito bem ao antecipar a resposta: somos do País de Abril, como Alice é do País das Maravilhas. Assim, quando a semente deixa de ser princípio e o craveiro uma instituição, a maneira mais própria da floricultura do Estado é pôr a vergonha ao peito.
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