20 janeiro 2008

Vaticano. Do que o papa precisava

De frei Bermudas, legado no Vaticano:

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Hoje, domingo, a Praça de São Pedro vai encher-se – são aguardadas 300 mil pessoas em manifestação de solidariedade com Bento XVI, à hora do Ângelus, como resposta aos protestos de professores e estudantes da universidade romana La Sapienza. Destacados dirigentes dos três partidos de centro-direita, Aliança Nacional, Força Italia e União dos Democratas Cristãos, confirmaram a sua presença assim como líderes sindicais, associações e estudantes de colégios e universidades católicas, além de vários dirigentes da formação de esquerda Pólo Democrático. A iniciativa foi lançada pelo cardeal vigário de Roma, Camillo Ruini.

Independentemente do que aconteceu (um equívoco que o Vaticano esclarece em comunicado oficial e tudo poderia ficar por aí), o papa necessitava desta manifestação ou de uma manifestação destas, fosse pelo que fosse. Todavia, este episódio ou equívoco de agora – a propósito de Galileu -, faz lembrar ou episódio ou outro equívoco, em Setembro de 2006, quando o mundo islâmico se ergueu num coro de protestos pelas palavras de Bento XVI, na universidade de Regensbourg, quando o papa citou a resposta do imperador bizantino Manuel II Paleólogo a um estudioso iraniano, há seis séculos. Para desfazer o equívoco, o papa viu-se forçado a apresentar meias-desculpas: "Estou profundamente desgostoso pelas reacções em alguns países a uma pequena passagem do meu discurso, considerada ofensiva à sensibilidade dos muçulmanos. Trata-se, na verdade, da citação de um texto medieval, que não exprime em absoluto o meu próprio pensamento", pela versão que correu a partir da tradução oficial do Vaticano para inglês, muito embora na versão original italiana, Bento XVI tenha dito apenas sono rammaricato ou "estou desapontado" e não "profundamente desgostoso".

Desta vez, o Vaticano esclareceu que os professores da univerdade La Sapienza atribuíram ao papa uma frase de um discurso que ele pronunciara em 1990 quando ainda não era papa. O comunicado oficial afirma que o então apenas cardeal Ratzinger, discorrendo sobre a crise de confiança na ciência e da ciência nela mesma, evocara a mudança de atitude da igreja e que a citação contestada - "o processo contra Galileu foi justo e razoável" - era do filósofo Paul Feyerabend e não do cardeal Ratzinger.

Corre pelos observadores junto do Vaticano que Bento XVI tem motivos para não se sentir muito feliz com citações alheias recentes ou do passado longínquo, gerando equívocos. E há quem interprete a manifestação de hoje como uma compensação da omissão de solidariedade de que o papa necessitou aquando o equívoco de Manuel II Paleólogo que levou o papa a meias desculpas, e não tanto pelo equívoco com a frase, afinal, do filósofo Paul Feyerabend, a qual não foi do cardeal de há 18 anos, muito menos de Bento XVI de agora. Em todo o caso, relativamente apaziguado que está o mundo islâmico desde o equívoco da tirada do imperador bizantino, uma manifestação de 300 mil pessoas à porta, embora tardia e motivada por outro equívoco, não deixa de ser oportuna para Bento XVI, tão oportuna que nada tem a ver com os efeitos da resposta de Manuel II Peleólogo num diálogo de civilizações há seis séculos.

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