26 abril 2013

Um caso de diplomacia muito económica com petróleo

Hábito antigo. Quando por qualquer motivo chego a uma cidade estrangeira, a primeira coisa que faço mal me instalo no hotel, é verificar se o anterior ocupante deixou alguma lembrança para a posteridade e que tenha escapado à brigada de limpeza. Desde um relógio valioso deixado atrás de um candeeiro e que prontamente entreguei na receção, até um poema manuscrito em árabe que encontrei em Genebra dentro de uma bíblia cristã, a coleção foi aumentando e é apreciável. Em Nova Iorque, por exemplo, o meu antecessor de aposento ali mesmo perto da ONU, deixou uma lista de contactos confidenciais com uma vintena de chefes de Estado e observações curiosas com setas a partir dos nomes, desde a comida favorita até ao interesse por cavalos. Mas indo ao que importa, em certa capital africana que respira petróleo, houve mesmo um achado. Alguém, que não sei quem foi, por inadvertência, deixou debaixo do telefone quatro desses papelinhos autocolantes com anotações sobre evidente negócio de petróleos, contactos com escritórios em Lausana e em Londres por cerro intervenientes, nomes e contactos da embaixada do país seguramente de origem do antecessor, e não sabendo ao que para isso seria chamado, até o número de contacto com o rei de Espanha para o seu iate. E lá constava o volume da transação, valor em dólares e número de barris, tudo discriminado. O montante em dólares e a quantidade de petróleo despertaram-me interesse imediato. Nunca tinha visto os meandros desse negócio assim descritos numa letra apressada e com a indicação de caminhos aparentemente completa. Sabia que o país onde me encontrava tinha compromissos de dívida a cumprir com outros Estados, tendo acordado, com um ou outro, pagamento em tranches, não em dinheiro mas em petróleo. Curiosamente, após rápida indagação, verifiquei que o país anfitrião estava em incumprimento, com um deles e que era a Espanha, nem a Suíça nem o Reino Unido, na tranche periódica, em valor exatamente igual ao que os papelinhos me davam conta. Ou seja, esse petróleo que deveria servir para pagamento, foi desviado e negociado informalmente. E apenas por homenagem ao meu antecessor descuidado, por vénia perante este género de "diplomacia económica" e por pudor relativamente à moral do país anfitrião, é que não publico os papelinhos. Resta dizer que o país credor ficou por muito tempo a arder à espera da tranche. Muitas vezes também se chama a isto cooperação.

2 comentários:

Anónimo disse...

Curioso... Chama-se a isso "deixar a perna de fora".

Anónimo disse...

É assim que tais "intermediários" ganham milhões.
JF