26 outubro 2006

Luanda. Quando uma gralha se torna pardal de Estado

Conta-se em poucas palavras. Um despacho da Lusa, ontem, fazendo subir ao noticiário quotidiano a deslocação do Presidente angolano a Moscovo, dava conta a dado momento de que José Eduardo dos Santos e Putin iriam reforçar o relacionamento bilateral com a assinatura de «acordos de corrupção» - gralha evidente, corrupção em vez de cooperação. Nem daríamos por isso se, hoje de manhã, a agência não tivesse feito a correcção. E mesmo feita a correcção, o caso passaria como acaso, se em Luanda não se fizesse disso um ocaso.

Mas, dizem-nos de Luanda, a gralha provocou alvoroço, e o alvoroço fez com que dedos se apontassem para o delegado da Lusa na capital angolana, como se uma gralha, lamentável por certo, mas que não é crime nem sequer deliberado delito de afronta à honra e à razão de Estado, que fundamentasse castigo. Fontes angolanas evitaram precisar o castigo preconizado ou a preconizar, mas garantiram que a gralha foi mesmo considerada como crime, o que, em certo sentido se compreende por causa da sensibilidade justamente ferida pelo falso dardo desferido na Suíça e que induziu muita gente em erro, inclusivamente NV, e não foi gralha, foi pardal, foi a peça, e não letras voláteis de uma palavra isolada ainda por cima terminada em -ão tal como na que devia surgir original. No caso do texto da Lusa foi obviamente gralha, inadvertência, efeito da rapidez que corrompe letras do teclado - acontece com todos, na Lusa, na AngolaPress, no Jornal de Angola, e, mais do que em todos, nestas mesmas NV. O MIREX João Bernardo de Miranda que foi jornalista e responsável do Departamento de Informação do MPLA sabe que assim é, tanto que um fax que ele nos enviou, há bastantes anos nessa última qualidade, estava cheio de gralhas e a consideração pessoal, em matéria de honra, da nossa parte não diminuiu lá por isso, pelas gralhas.

Quando há gralha e não pardal, duas atitudes são possíveis: uma, a que preferimos, é a atitude de humor pelo contraste e de desconto pelo acaso, atitude de desinflação do aborrecimento, embora as gralhas, todas elas, aborreçam; outra atitude, carrancuda, é a de transformar, seja a que pretexto for, uma gralha, para mais portuguesa, em pardal suíço, fazer desse bicho arvorado um indício de excepção sediciosa, e, transformada a ave já em monstro, elevar a gralha a razão de Estado que se apresenta e retoca como supostamente ferida. Ora, um deliberado pardal suíço está para o sentimento anti-angolano (que há), assim como uma gralha promovida a pretexto pode estar para o sentimento anti-português (que também há). Ambos são ganchudos.

E se a explicação da gralha estiver no uso do corrector automático, até Putin se rirá do caso, pois o corrector, desculpem-nos os fundamentalistas da informática (angolanos e portugueses), são como os pardais suíços - corrigem a palavra verdadeira para a opinião que a gralha não tem. Experimentem, por exemplo, escrever «copração» , que, faltando a penugem de um «o» e de um «e» à palavra pensada, o corrector, que não pensa, faz da gralha, o que só, por mau sentimento parece um pardal. Por isso, os correctores automáticos, MIREX João Miranda, são inimigos da cooperação.

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