25 janeiro 2007

Muitas razões insondáveis e um motivo claro

Primeiro, foram as contrariedades - todos as temos e a cada um chega a sua vez. Depois, não há que esconder, foi uma sensação de desapontamento – afinal, o que adianta alguma preocupação sobre a política externa portuguesa, o que se ganha com algum escrutínio da acção diplomática e da actuação dos seus agentes? E que avanço há com alguma preocupação também com os serviços consulares, por tradição talhados como o alfaiate talhava o fato, mais curto para perna curta, mais comprido para perna comprida, confinado ao tecido e à medida do cliente, quando a malha consular em vez de ser tesourada com um fato da fazenda da Nação, deveria ser pensada e avaliada como estratégia de Estado, estratégia que é a pele do Estado e não o seu fato?

Sem excepção, todos os que têm desfilado pelas Necessidades com o ceptro político nas mãos (uns com ceptro circunstancialmente efémero, outros, como é o caso presente da maioria absoluta, com esse ceptro tão colado ao corpo como o espírito santo à santíssima trindade) todos têm repetido essa declaração de bom tom sobre a abertura à crítica e com sublinhados para o diálogo, mas na hora de confronto com a emenda do que deve ser emendado, perdem esse verniz que a sobrevivência política em democracia aconselharia a não deixar que estale. Sem dúvida que estamos desapontados com esta política externa quase reduzida ao protocolo, sem golpe de asa, processional, ou, por outras palavras, reduzida ao bom comportamento – à imagem pública do bom comportamento, em função da qual se sacrifica a crítica, o diálogo e a emenda. E quando tudo isto se sacrifica, é quando começa a nascer lá no fundo da alma o desejo de uma polícia de opinião, ainda que, por pudor, esse feto que não aborta da sociedade portuguesa, se mantenha invisível.

Todavia porque, por razões insondáveis e apenas por um motivo bem claro – o de se recusar ser bobo da corte -, ao desapontamento se segue a inquietação, vamos prosseguir. Mas que cheira já a verniz estalado, lá isso cheira.

Carlos Albino

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