13 fevereiro 2007

Briefing. Os diplomatas e o os consulados.

Briefing. «Nem sempre sou da minha opinião» – só por esta tirada que lhe pertence, Paul Valéry merecia ter tido maioria absoluta em Portugal.

1 – Declaração prévia
2 – Diplomatas e reestruturação consular


1 – (Declaração prévia) – Minhas Senhoras, Meus Senhores, antes de mais, sejam bem-vindos. Retomamos os nossos briefings, hoje apenas centrados num tema – o que pensam os diplomatas sobre a proposta de reestruturação consular. Sabemos da vossa curiosidade sobre outras matérias relevantes, mas tenham paciência, o mundo não termina continua amanhã. Desde já, lamentamos que os meios de comunicação portugueses – nomeadamente a televisão pública - não se tenham interessado por uma questão que afecta milhões de Portugueses e se prende com inegáveis razões e interesses do Estado. Estamos à vossa disposição. Se faz favor…

2 – (Os diplomatas, de modo geral, apoiam ou contestam o plano de reestruturação?) – Podemos avançar que os comentários dos diplomatas são deveras demolidores. Não encontramos outra palavra.

(E que argumentação é invocada pelos diplomatas?) – Primeiro, pensam os diplomatas que não se vislumbra a razoabilidade de equacionar uma reestruturação da rede consular à revelia da também anunciada reestruturação da rede das missões diplomáticas.

(Apenas isso?) – Não. Os diplomatas advertem que não se encontram minimamente demonstrados os pressupostos que informam o projecto de reestruturação, nomeadamente a nível de aperfeiçoamento organizativo, de inovação informática e tecnológica, de redução de custos de funcionamento e da sua eventual projecção na eficácia das serviços.

(Essa é forte, os diplomatas não costumam falar assim Por regra, são mais elípticos. Mas os diplomatas ficam por aí?) – Concordo consigo, os diplomatas nem sempre são da sua própria opinião, mas desta vez acabaram por deixar claro que os objectivos que o projecto de reestruturação visa, são redutores da acção a desenvolver à luz de uma concepção consular moderna, nomeadamente a nível político, económico, cultural e de representação externa do País. Argumentam os diplomatas que os critérios ou pressupostos tidos em conta para o plano são próprios de quem tem de um consulado o conceito de «loja do cidadão», desconsiderando as valências política, económica, cultural ou de representação do Estado e do Governo português.

(O que querem dizer com isso?) – Querem dizer que uma reestruturação pensada apenas em função e tão só do número de portugueses residentes, portugueses inscritos, número de actos consulares, número de funcionários, número de associações portuguesas na área e número de professores de português, parte de um critério penalizador dos interesses a defender e, sobretudo, desconsidera as valências que um consulado moderno deveria assumir.

(Mas há consulados que são praticamente sinecuras de diplomatas!) – É verdade, isso está mal, e o Estado não pode ver os consulados como os beneficiários de sinecuras os vêem. A não ser que o Estado Português entre também em sinecura, porque em sinecuras, felizmente, estamos à cabeça da Europa – podemos garantir isto, com todo o orgulho, aos chineses.

(O senhor está a resvalar. Mas não é a poupança que está na ordem do dia?) – É verdade. Também nesse ponto, os diplomatas comentam que é singelamente que na reestruturação proposta, se assinala permitir uma poupança de 3.645.424 de euros. No entanto, não entendem os diplomatas que não se aluda aos cerca de 6.500.000 euros que diariamente os emigrantes remetam para Portugal. Além disso, que por recurso a critérios tão só contabilísticos, sejam acriticamente ignoradas as diferentes políticas que o Estado prossegue, designadamente a política externa e a política de apoio às comunidades e de projecção no estrangeiro.

(Mas então o que é que os homens queriam que fosse feito?) – Homens? Que linguagem é essa? Muitos diplomatas são mulheres!

(Desculpe, é a pressa. Desculpe.) – Bem! Os diplomatas desejam que numa reestruturação da rede consular pensada em simultâneo com uma reestruturação da rede de missões diplomáticas, fossem tidos em conta os critérios da dimensão ou perfil político do posto, da dimensão ou perfil económico do posto, da dimensão cultural do posto, e da dimensão de representação diplomática do posto, concreta ou simbólica, do ponto de vista das relevantes autoridades locais ou das comunidades portuguesas expatriadas. E isso não foi levado em conta.

(Culpa de António Braga ou, como de costume, de quem rodeia?) – Não fazemos especulações. Naturalmente que o secretário de Estado António Braga está muito a tempo de estancar especulações e de conciliar firmeza com diálogo, emendando os critérios com que normalmente se inundam as secretárias do poder nas Necessidades. É o que os diplomatas comentam, embora, um a um deles, salvo excepções de opito em oito, digam que nem sempre são da opinião que têm…

(E as críticas que, segundo o senhor nos diz, são demolidoras, ficam por aí?) – Não. Os diplomatas, também de forma clara, dizem que é inaceitável a proposta de desgraduação de alguns dos actuais postos consulares e de carreira. E argumentam que o que se economizaria em termos orçamentais seria certamente superado pelos custos negativos para a imagem e eficácia da acção externa do Estado português.

(O senhor está a sugerir então, ser esta mais uma matéria que o Presidente Cavaco Silva vai seguir com atenção…) – Perguntem isso, por favor, a Belém que, de resto, não é, e oxalá que não venha a ser, mais um Consulado-Geral .

(Com certeza! Os diplomatas são demolidores. Mas e de positivo? Essa gente só destrói? Não apresenta soluções construtivas?) – Muito obrigado por ter levantado essa questão, que é muito importante…

(… oh! Por favor! Ponha de lado essa chapa-zero do muito obrigado por ter levantado essa questão… Deixe isso para os ministros que têm a vaidade como principal assessora e nem sempre são da sua própria opinião! Vá ao assunto! O que é que os diplomatas sugerem?) – Não ofende porque vejo na sua observação uma homenagem a Paul Valéry. (Risos, muitos risos na sala, grandes gargalhadas do correspondente da RTL). Em primeiro lugar, os diplomatas sugerem que o projecto de reestruturação vá de par e com ela se articulando, com a anunciada intenção de reestruturação da rede de missões diplomáticas. Segundo lugar, aconselham os diplomatas que seja mais consistentemente ponderado o desejável projecto de reformulação de funcionamento da estrutura consular portuguesa; terceiro, que se tenham na devida conta os objectivos políticos, económicos, culturais e de representação que devem ser prosseguidos pelos consulados portugueses que, para o efeito, deverão ser dotados dos indispensáveis meios e orientações estratégicas – o que paradoxalmente não tem acontecido; quarto lugar, que não se agridam as comunidades portuguesas expatriadas com o simples enunciado de encerramento ou desgraduação dos consulados em que se encontram inscritas sem ao menos se lhes comprovar convenientemente as vantagens derivadas das melhorias na prestação de serviços e de protecção consular que se anunciam e a que têm direito.

(Sim, senhor! Resuma tudo numa palavra porque tenho que telefonar já ao chefe que quer saber se isto dá manchete) – Resumindo e concluindo, os diplomatas advertem que um consulado é muito mais que uma loja do cidadão. Muito mais! E menos que isso, é péssimo. É tudo por hoje, sabendo que os senhores, em função do novo Estatuto do Jornalista, nem sempre são ou quase nunca são da vossa própria opinião.

(Novas gargalhadas do correspondente da RTL)

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