É consensual. Sem dúvida é consensual que a malha consular tem que ser repensada, algum dia deveria ser redesenhada, e em algum momento, alguém com coragem política e munido de estudo fiável, surgiria com a intenção, o projecto e a decisão de reforma. Julgamos que foi essa a meta que António Braga terá traçado para si mesmo, no primeiro momento em que assumiu a tutela dos assuntos consulares, ou pelo menos julgado que assumia, não pela tradicional delegação de competências do primeiro MNE com que se cruzou, mas pela evidente e consabida confiança política que o primeiro-ministro lhe destinou ao indicá-lo para o cargo. E mais não se diz porque Freitas do Amaral já não está no governo, sendo assunto para historiadores, e com Luís Amado a questão não se coloca.
Repensar os consulados não é, todavia, um jogo de tira e põe, encerra aqui e muda ali, fazendo-se apenas e só as contas finais dos milhões que se poupam nesse jogo, para que o Ministro das Finanças tenha um efémero assomo de contentamento. O jogo é mais sério, caso se queira reformar a sério a malha consular, porquanto, mesmo nesse plano das contas imediatas, haverá que perguntar se e quanto é que o Estado Português perde ou deixa de ganhar com a actual rede consular, caso esta não esteja optimizada nas suas incumbências, atribuições e razão de ser. Portanto, ainda no plano das contas e das meras contas, haveria que verificar se os consulados estão a ser consulados por inteiro, consulados a sério.
Mas, ou por via do exercício sério das contas, ou pelo criterioso inventário das funções que os consulados efectivamente desempenham, ou ainda pela identificação daquilo que os consulados deveriam ser e não são à excepção de algum voluntarismo local ou orientação excepcional, caso assim se queira, chegar-se-á sempre ao molho de questões essenciais, não se desligando uma questão das outras: Portugal está a tirar partido da sua rede consular? E esta rede consular está ou não em conformidade com as atribuições consulares convencionadas? Não haverá «consulados» que não são consulados e que esvaziam os consulados? Há ou não uma carreira técnica consular apta a assumir por inteiro as atribuições convencionadas para os postos consulares, já que os postos de carreira é que estão na primeira ordem de considerações, numa perspectiva de reforma? Onde é que Portugal perde e onde é que nada ganha podendo ganhar, e em função de que obstáculos e interesses?
A verdade é que não se descortina no documento «técnico» da reestruturação, referido pelo Ministro, respostas a essas questões - nem elas foram formuladas,os critérios elencados estão aquém, muito aquém do que uma reforma séria, e as questões fomuladas não são questões de consulados mas apenas trabalho de casa para algum assomo efémero de regozijo do Ministro das Finanças.
Admite-se que, por erro de paralaxe, se olhe para a Rede Consular apenas pelo lado das mazelas do peso que ostenta, e da implantação e rotinas que de alguma forma não redimiu tal rede, antes pelo contrário, daquela lógica que, durante muito tempo, emparedou os postos consulares (que até já teve carreira) entre a caça às divisas da emigração e o caritativo instituto de apoio à mesma emigração, espécie de Tio Patinhas sem profissão de modernidade de Estado e de serviço de Estado. Só que um erro de paralaxe é um erro, não determina critérios correctos e aceitáveis.
Este documento «técnico» é um erro de paralaxe.
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