04 março 2007

[Ponto.Crítico] 4 Diploma de colecção

[Ponto.Crítico] O «Curso de Política Externa Nacional 2006/2007», promovido pelo Instituto Diplomático, sugere a oportunidade da pergunta: depois disto o que já ficou?

O modelo de conferência atrás de conferência, modelo seguido um pouco por todo o lado mas não para os mesmos fins; o esquema de pretensão a esgotar todas as doutrinas do Globo e de soluções de oratória para todos os temas da Terra; o fito de comprimir o gigantesco esforço de saber próprio das universidades na little box do Instituto Diplomático; e a tentatória solução de dar credibilidade à cauda do curso mais pelo peso dos oradores do que pela premência, adequação e coerência dos temas, tudo isso, dificilmente poderá responder às três questões essenciais num curso de política externa nacional – a primeira questão, qual e como é a política externa nacional; a segunda questão, para onde e com que problemas identificados corre ou se executa a mesma política externa; terceira questão, que meios, perspectivas e campos de actuação tem ou se oferecem à mesmíssima política.

Responder (e aprender) de forma investigativa e científica a essas questões seria obviamente muito mais difícil e possivelmente mais incómodo do que, a pretexto de política externa nacional, discorrer sobre a Paz de Vestefália (estando nós num país com 90 por cento de historiadores), explanar sobre as perspectivas teórico-metodológicas no estudo das relações internacionais (dados que deveriam estar como adquiridos pelos auditores do curso) ou colocar em cartilha simplificada o b+á=bá mais que sabido do que se designou por quadros focais da política externa portuguesa, com patine teórica (como somos sábios em colocar patines!). Ninguém duvida da relevância da América Latina na política externa portuguesa, a matéria até pode dar um seminário, umas jornadas sobre a relevância. Mas, num curso de política externa nacional, o que interessará fixar, debater e enquadrar na parte superior do espírito é qual a política externa portuguesa relevante para a América Latina e suas partes. E, num exemplo em que procura o brilho de um orador para deslustrar o tema, é num curso de política externa nacional que ainda se perde tempo sobre se o direito internacional é Direito, tema que a Constituição arruma?

E que dizer de um curso que pouco mais é do que desfile de conferências e prova de estante, em que um só e mesmo orador consegue surgir num dia a falar sobre um mundo em globalização, a nova ordem internacional, depois sobre o direito da guerra, passado mais um tempo sobre os conflitos assimétricos, antes disso sobre a diplomacia cultural enquanto modalidade soft power, para, depois de tudo isso, conferenciar ainda sobre a história, política, economia e cultura na Ásia do Sudoeste e na Bacia do Pacífico?

Naturalmente que o Instituto Diplomático com as suas limitações, a começar pelo seu orçamento e a terminar nas suas finalidades e justificação de ser, em vez de entrar pelo caminho de uma little box universitária, deveria ter-se aplicado com vocação no erguer de uma Escola Diplomática, pequena e modesta que fosse, mas apta a formar para a vida da carreira e para a carreira da vida preferencialmente os adidos de embaixada, apta a dar formação aos técnicos especializados, aos funcionários dos postos externos e dos serviços centrais que de formação carecem e reclamam. Trabalho não falta ao Instituto Diplomático e o dinheiro seria nisso melhor aplicado do que gastá-lo no desfile de indiscutíveis sumidades, passado o qual se pergunta - O que ficou? Um estimável diploma de colecção?

Carlos Albino

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