Artigos publicados em jornais
com assinatura conjunta de chefes de chancelaria,
primeiros-ministros e mesmo chefes de estado,
seguem o método que na culinária pode resultar em pratos apetecíveis,
mas que na política vai do sem-sabor ao intragável.
MINISTROS de Estrangeiros, primeiros-ministros e até chefes de estado têm-se empenhado cada vez mais em subscreverem artigos a dois, a três ou mesmo mais, publicados em jornais de referência, por vezes publicados simultaneamente em duas, três ou quatro capitais. Por regra, como tem sido evidente, nada dizem de novo sobre as matérias que versam, nem nada que já não tenham dito sobre o que pensam.
Cultivada na Europa com Portugal incluído (sobre o Tratado, viu-se), a moda chega à América Latina. Hoje mesmo, o Estadão acolhe um desses textos a duas mãos, do ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, e do chefe da diplomacia da Rússia, Serguei Lavrov. «Rússia e Brasil, amigos e parceiros estratégicos» é o título da pizza de parágrafos que não chegam a revelar opinião como se requer num artigo, e ficando muito próximo do que será uma moção aprovada sem votos contra e sem abstenções numa assembleia geral de dois.
São os artigos-pizza, um disco de massa fermentada, regado com o molho das relações bilaterais e coberto com ingredientes variados da política internacional a que não falta o queijo, muito queijo que faça esquecer os pontos negros e as lassidões da política externa dos países a que cada ministro subscritor pertence e cujos nomes, apenas os nomes de quem são, dão aroma a essa prosa inócua redigida nas chancelarias, tal como o orégão ou o manjericão aromatiza as pizzas reais. Com esse método, nos preparados culinários, é verdade que se pode chegar a um prato apetecível, mas nas prosas de chancelaria mais não resulta que uma pizza que vai do sem-sabor ao intragável.
Mas porque é que ministros, primeiros-ministros e chefes de estado que têm entrevistas à disposição, que podem convocar conferências de imprensa a qualquer hora, e que podem isoladamente ou em conjunto emitir comunicados ou fazer declarações sobre temas prementes, convenientes ou urgentes, recorrem aos artigos-pizza? Certamente, por uma questão de garantia de publicação apenas e, diga-se, por via desta por uma questão de afirmação pública de duvidosa eficácia, porque o prestígio não se força e não pode ou não deve ir ao forno.Carlos Albino
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