27 agosto 2011

PONTO CRÍTICO 38 : Episódio, chegou a hora de contar

Pequena história
sobre o início
disto
    EM CERTO MOMENTO, a pretexto de remodelação gráfica, a coluna semanal Diplomacia foi cortada sem que o diretor do jornal tivesse tido a frontalidade de o dizer ao jornalista responsável – foi entretendo, contornando e iludindo, inclusivé com anuências de hipócrita gestão de conflitos – “estou muito sensibilizado para o assunto, tudo farei para se ultrapassar o problema”, chegou a dizer.
    Claro que, ao corte da coluna, não eram estranhos telefonemas do gabinete do ministro que, depois, veio-se a saber, eram feitos sem que o ministro sonhasse que eram feitos em nome dele. Mas, para os estranhos, o jornalista lá ia justificando a suspensão da coluna com a explicação menos envergonhada de que estava pendente da remodelação gráfica. Semanas passaram até que em dado momento – o momento aviltante do sorriso medroso do diretor gráfico – se tornou evidente que a suspensão era corte e, pior do que corte, era ato de exceção censória. Sem dúvida que o diretor estava no seu direito de poder, embora à revelia dos elementares deveres profissionais e de urbanidade recíproca entre jornalistas. E foi nesse momento de meio da tarde de 25 de junho de 2003 que o jornalista, deixando entreaberta a porta do diretor, se dirigiu à sua secretária e criou este blogue, sob o pseudónimo de Anaximandro – Notas Verbais, escolhendo como frase a que chamou fundadora, a frase de Malebranche «é preciso tender para a perfeição sem a pretender». E assim começou isto que já vai para oito anos.
    Só anos mais tarde é que vim a saber que o diretor, confrontado diretamente por alta figura do Estado com o que lhe tinha soado, o corte censório da coluna, se socorreu de uma explicação que só resiste quando quem fala está convencido de que fala em segredo de confessionário. O que disse? Que o jornalista, a troco da coluna, recebia uma avença do Ministério. E podia justificar-se com tanta coisa mais verosímil! Que o jornalista não tinha fontes ou tinha má fontes, que plagiava, que redigia mal ou distorcia, ou que tinha encontrado um génio com modéstia adequada ao seu projeto de aldrabão sorridente, que qualquer coisa, daquelas coisas em que a subjetividade trepadora não põe em crise a objetividade de quem assim trepa. Mas não. Traído por certo pelo veludo do repentismo, optou pelos espinhos da invenção e da mentira. Que ficaram com ele.
    As Notas Verbais nasceram assim. Numa tarde de junho.
    Carlos Albino

2 comentários:

Jorge da Paz Rodrigues disse...

Ora, sendo assim, o que se lamenta, fomos nós, leitores, que ganhámos com este excelente blogue sobre assuntos diplomáticos, matéria em que, "pecador me confesso", eu era um "zero" e agora já sei qualquer coisita.

Na verdade, quem perdeu foi o "DN".

Anónimo disse...

"Anónimo,
E em boa hora nasceram, as NV. Ainda me recordo-me bem da coluna Diplomacia, no DN, que lia, tal como muitos outros colegas. Quanto ao episódio aqui descrito, que acabou por estar na origem das Notas Verbais, é lamentável, mas não me surprende, à época.
Ainda quanto às NV, confesso que me diverte o azedume que provocam em certas mentes, pouco ou nada habituadas a que lhe façam críticas, ali para os lados do Rilvas. E há os fingidores, que dizem que nunca as leem, mas que nunca passam sem as consultar diariamente.
E como o medo nunca foi meu apanágio, deixo aqui - abertamente - votos, sinceros, de continuação para as NV e muita saúde ao seu autor, Carlos Albino.
Paulo Rufino,
Zurique"