11 abril 2008

PONTO CRÍTICO 16 Esclareça-se

Cabe ao Estado Português das duas uma:
ou declara firme e oficialmente quem é duque,
não se sabendo como o possa fazer,
ou, pondo em crise o teor de supostas posições oficiais
emanadas do ex-consulado-geral em Milão
e da embaixada em Roma, em carta a latere de nota verbal,
declara-se isento nessa disputa entre interesses privados,
sobre os quais a justiça não se pronunciou no âmbito do direito sucessório


PELO QUE SE APUROU. Ontem, na primeira audiência, de carácter processual, do julgamento de Rosário Poidimani no tribunal de Busto Arizio, foram levantadas duas questões – se o acusado é ou não detentor de soberania (decorrente de titular de casa real não reinante), e se no caso cabe ou não competência do tribunal que aprecia matéria pela qual o acusado foi detido e mantido por seis meses em prisão preventiva, na sequência de denúncia da embaixada de Portugal em Roma compaginada com posições oficiais veiculadas pelo ex-consulado-geral em Milão, por uma carta feita chegar ao protocolo do Estado italiano a que posteriormente se juntou, mas sem efeito prático a não ser o interno, um parecer jurídico do MNE que ficou encalhado no patamar da decisão política.

Quanto à competência do tribunal, soube-se que os juízes de Busto Arsizio se declararam competentes para julgar, apesar de noutra comarca judicial italiana (a de Vicenza) correr paralelamente outro processo também contra Rosário Poidimani com a mesma base ou invocação de substância – as referidas comunicações do ex-consulado-geral em Milão com filosofia oficial do estado sobre direitos sucessórios monárquicos, e a citada nota verbal da embaixada em Roma adornada nos anexos em tribunal pela carta do embaixador Vasco Valente que vai mais além que a nota. O processo em Busto Arsizio está associado à detenção de Rosário Poidimani em 2007, enquanto o de Vicenza relaciona-se com o encerramento de escritórios de uma 'Real Casa Portuguesa' que o acusado mantinha na por si invocada qualidade de 'duque de Bragança' e 'chefe da casa real portuguesa'. Segundo nos garantiram, tais escritórios foram entretanto reabertos não tendo as investigações feitas pelas autoridades italianas, ao que se sabe, apurado indícios criminais que possam ser recortados das denúncias que, também elas, não continham factos concretos e provas precisas, como nas matérias criminais se requer.

Quanto à matéria de invocada 'soberania', o tribunal de Busto Arsizio terá registado a argumentação de Rosário Poidimani mas rejeitou uma tal situação de soberania sem territorialidade, decisão que pode dar azo a recurso sendo esse um tema de discussões jurídicas com fim a perder de vista. Por outro lado, também poderá ocorrer requerimento para junção dos processos de Busto Arsizio e de Vicenza que têm como base as mesmas ou semelhantes acusações.

Seja como for, uma primeira sessão do julgamento da matéria em questão, pelo que ontem foi decidido no tribunal de Busto Arsizio está marcada para 30 de Outubro.

E a matéria em questão é se Rosário Poidimani pode ou não intitular-se legítimo titular ou se lhe cabe legitimidade para o título de 'duque de Bragança' e 'chefe da casa real'. Se tem esse direito ou legitimidade, goste-se ou não dele, concorde-se ou não com ele, seja ele daqui ou dacoli, ninguém o pode acusar de usar falso título. Se não tem, a conclusão não é difícil mas não depende de mera opinião - depende dos tribunais a quem compete julgar litígios entre partes interessadas, mesmo que os litígios sejam gerados por títulos que não constam na ordem de precedências do protocolo da estado, como é o caso.

Ao ponto a que se chegou, e em função da dúbia gestão tolerada pelas Necessidades, cabe ao Estado Português das duas uma: ou declara firme e oficialmente que reconhece outra personalidade, não se sabendo como o possa fazer mas acolhendo o célebre parecer do MNE sem homologação política, ou declara-se isento nessa disputa entre interesses privados sobre os quais a justiça não se pronunciou, e assim pondo em crise o teor das supostas posições oficiais emanadas do ex-consulado-geral em Milão, de alguma forma também a nota verbal da embaixada em Roma, mas cabalmente o teor de carta do embaixador Vasco Valente ao Protocolo do Estado italiano reforçando a latere a denúncia contida na referida nota.

É um assunto interessante para se ir acompanhando, porquanto o esclarecimento dos incidentes que chegaram aos para nós remotos tribunais de Busto Arsizio e de Vicenza podem contribuir para, de vez, se arrumar essa quezília nobiliárquica de uma real expressão a que pelos menos três pretendentes almejam, e onde não vemos como seja o MNE, ou alguém por ele, a pronunciar-se em definitivo, com solidez institucional, jurídica e política. Muito menos um consulado-geral onde por vezes só nos saem duques.

Daí que, tenhamos paciência, numa página de questões de diplomacia, alguns instrumentos transcorridos como diplomáticos tenham ou devam ser escrutinados – não está em causa a segurança, a defesa ou qualquer dos interesses vitais do estado, está em causa tão só a credibilidade e a honorabilidade da República.

Carlos Albino

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