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Há portugueses que mereciam passar pelo Hardtalk e com urgência.
Diplomacia portuguesa. Questões da política externa. Razões de estado. Motivos de relações internacionais.
Começa. O Ministério Público de Munique emitiu ordens de captura em nome de 13 alegados elementos da CIA implicados no sequestro do alemão de origem libanesa Khaled El Masri, que foi transportado num dos voos com escala em aeroportos europeus. Ler notícia do Público
Curiosamente, o representante do Irão, Hossein Gharribi, justificou as reservas do seu país apenas pelo texto não referir o que aconteceu em Hiroshima, Nagasaki, nos Balcãs e no Ruanda... Progresso mental que, oxalá - vindo o nosso oxalá de onde vem, beneficie o embaixador de Teerão em Lisboa.
A CASA DA MÃE JOANA
Fernanda Leitão
Maher Arar é um sírio que escolheu viver no Canadá por acreditar que este país respeita os Direitos do Homem. Estabeleceu-se em Otava, casou com uma senhora do seu país de origem, tem dois filhos e obteve a cidadania canadiana. Engenheiro de telecomunicações, depressa obteve sucesso nessa carreira. Parecia estar realizado o sonho do jovem sírio.Mas tudo se quebrou e desfez em Setembro de 2002 quando, ao fazer escala num aeroporto dos Estados Unidos, foi preso pela polícia local, histérica com o seu nome, a sua barba, o seu país de origem e, principalmente, a confirmação dada pela Real Polícia Montada do Canadá quando lhe foi perguntado se o portador daquele passaporte era ligado ao Al-Qaeda. De pronto, como quem se desfaz de um trapo, a polícia americana deportou Mahar Arar para a Síria, apesar de o acusado sublinhar que ali correria perigo de vida por se opor ao regime local. Esteve mais de um ano preso na Síria, torturado, mal tratado, sempre à espera de ser morto pelos seus algozes. Isso só não aconteceu porque sua mulher, a aparentemente frágil Moira, saltou obstáculos, congregou apoios, alertou o governo canadiano da altura, o do liberal Paul Martin. As autoridades canadianas não largaram o governo sírio até o seu cidadão regressar a Otava. Regressado, Arar procurou apoios e contratou um advogado, iniciando um implacável processo de esclarecimento dos factos e de reabilitação do seu nome. A revolta de todo o país transformou-se em apoio, em exigência democrática de explicações. O comandante da Real Polícia Montada, Giuliano Zaccardelli, negou perante as autoridades judiciais ter dado essa informação à CIA. O governo de Martin foi substituído pelo governo conservador, e minoritário, de Stephen Harper, um seguidor ostensivo de Bush e das suas políticas e, por isso, Maher Arar e o país em geral, esperaram o pior.
Não foi assim porque o Canadá é uma monarquia parlamentar que conta com todo um dispositivo de vigilância sobre os governos e, portanto, de defesa do povo. O aparelho de justiça seguiu em frente, cortou a direito. Zaccardelli que acabou por reconhecer ter mentido, assim assumindo que a falsa informação sobre Arar saíu da sua corporação. À mentira juntava-se o abuso inqualificável de entregar um cidadão nacional à polícia de um país estrangeiro. Encostado à parede, Zaccardelli pediu a demissão, saíu de cena sem honra nem glória. A justiça canadiana concluíu pela inocência de Maher Arar. Logo de seguida, Arar processou o estado canadiano exigindo que o governo lhe pedisse desculpa e uma indemnização de doze milhões de dólares pela sua carreira profissional destruída, pelo seu nome enxovalhado, pela prisão e torturas, pelo sofrimento da mulher, dos filhos, e dos seus próprios pais e irmãos. Os olhos de todo o país ficaram colados ao primeiro ministro Harper quando o tribunal deu razão às exigências de Arar. O empertigado Harper, tão colaço de Bush, tão concordante com a guerra do Iraque, tão ferozmente contra o protocolo de Kioto, ficou entre o muro da opimião pública canadiana e o barranco em que o seu ídolo está metido.
E foi, recentemente, o golpe de rins: o primeiro ministro pediu desculpa e ordenou o pagamento. Sem ninguém lhe pedir mais nada, até se apresentou como defensor do meio ambiente...
O pano desceu sobre este drama quando, dirigindo-se a todo o país pela televisão, Maher Arar, olhando bem de frente, agradeceu o apoio que recebeu de todos os pontos do país e disse muito claramente: “tenho orgulho de ser canadiano”. Bem pode ter orgulho de um povo que não quer ver o Canadá transformado na Casa da Mãe Joana.
Segundo tenho lido e ouvido, também a embaixadora Ana Gomes, actualmente eurodeputada, não quer que Portugal se transforme na Casa da Mãe Joana e exige que seja esclarecido esse embróglio dos aviões da CIA que pousaram em aeroportos portugueses para transbordo de prisioneiros islâmicos que permanecem sem julgamento e sujeitos ao mais vil tratamento.
A diplomata exige também que se apure o célebre escândalo do “petróleo por comida”, através do qual, a coberto da ONU e com os propósitos humanitários do costume, uns cidadãos portugueses fizeram belos negócios. Como todos nós, deste lado do mundo, a compreendemos e acompanhamos! Mas inquietos, muito inquietos, porque Portugal continua, como se diz em jargão político, deficitário em justiça e governos isentos, para descanso e impunidade de Barrosos, Portas, Figueiredos, Lopes e outrões varões assinalados...
Registe-se que o edifício do consulado, propriedade do Estado, é por regra apresentado pela Andaluzia como ex-libris da presença internacional em Sevilha. Comentaremos.
Missões diplomáticas com sites, são referenciadas em NV a partir de hoje.
Às missões sedeadas em Lisboa há que juntar mais 73 embaixadores acreditados mas residentes noutras capitais, o que perfaz um total de 150 Estados com relações diplomáticas directas com Portugal. Dessas missões sedeadas noutras capitais, apenas 20 dispõem de páginas oficiais, na generalidade sem qualquer referência a Portugal, por mínima que seja.
«Notas Verbais ao levantarem esta questão do Oil for Food, recordam o testemunho de Ana Gomes mas também deveriam recordar as perguntas de António Duarte na Grande Loja do Queijo Limiano, em Abril de 2005 e que transcrevo: Recordar-se-á (Ana Gomes) por ventura de alguma empresa portuguesa ou subsidiária da mesma, que tenha assinado contrato com a ONU para comprar petróleo ao Iraque ? Quem assinou o despacho que deu inicío à operação Oil for Food ? Para além de Ceyhan, onde a empresa UNOCAL detentora do consórcio Cent Gás, e face mais ou menos visível do financiamento via Al-Tawqa Bank aos iluminados da Al-Qaeda, o nome de Baniyas na Síria, não surgia em nenhum relatório, no que ao Smuggling , diz respeito ? Face ao estipulado pelas resoluções 986 e 1111, usar portos diferentes das de Mina-Al-Bakr e Kirkuk_Yumurtalik, para fazer sair petróleo do Iraque, é considerado exactamente o quê ? E, já agora, uma pergunta sobre algo que não sei mas que gostaria de saber - o citado na Nota Oficial do MNE e no relatório da ONU, Rui Cabeçadas de Sousa, era um conhecido ou um desconhecido do embaixador António Monteiro?
Eye de Belfast
«Não segui esse escândalo de perto, mas, pelo que me recordo e sei, com objectivos que nunca foram explicados, Portugal candidatou-se e foi eleito para dirigir o dito Programa das NU "Oil for food" encarregado de administrar o que era permitido ao Iraque de Sadam vender de barris de petróleo para fazer face aos gastos com medicamentos e produtos básicos para a população civil. O Iraque, com a aparente conivência de quem dirigia o Programa dado que tinha de aprovar cada transacção, vendeu mais barris do que o permitido. Isto foi possível dada a confiança de que gozavam dos gestores do Programa certas empresas fantoches. Presidia ao Programa o António Monteiro (então Representante nas NU/Nova Iorque) e era Administrador o Nuno Brito (então N.º 2 na Representação em Nova Iorque). Estarei enganado?
Retired but Presented, emb.
«Acabo de verificar nos links das suas notícias que o ex-Secretário Geral do Quai d´Orsay Serge Boidevaix foi preso devido aos benefícios financeiros que retirou do Programa, bem como um Jean-Bernard Mérimée. O ex-Embaixador de França nas NU , Jean-David Levitte, fez uma nota à imprensa em 7 de Abril de 2004 a explicar-se, mas nada fica claro da sua ligação a Boidevaix.
«Onze Ministérios Públicos solicitaram documentos à Comissão Volcker para procederem a investigações com vista a abrirem processos criminais contra seus nacionais, mas nada consta sobre a Procuradoria Geral da República.
Petronix
A comissão independente das Nações Unidas que investigou o caso (2 400 empresas acusadas em todo o mundo de terem pago subornos ou comissões ilegais ao regime de Saddam, num relatório de 630 páginas) deu o seu trabalho por terminado em Dezembro passado. Há uma excelente síntese do escândalo na Wikipedia, mas também pode ser recapitulado em Oil-for-Food ou no site oficial do programa da ONU.
Igualmente apagam hoje mais uma velinha do bolo, três assistentes administrativos especialistas do MNE, Rosa dos Santos Nogueira, Luís Coelho Brás e Fernanda Nicolau Lima.
NV desafiam os leitores a, primeiro, espreitar o blogue da Embaixada de Portugal em Brasília AQUI, e, depois, a votar sobre essa ideia, comprovadamente pioneira por entre representações diplomáticas. Julgamos até que o ministro Teixeira dos Santos deveria ser o primeiro a votar, uma vez que a ideia não tem incidência orçamental... O barómetro fecha no próximo domingo e a qualquer momento todos podem consultar os resultados. Cada um só pode votar uma única vez, e nada de truques, por favor.
Qual a indignidade congénita de Curitiba, capital de Estado como as restantes, para não merecer que o consulado seja transformado em vice-consulado, como em Belém, Porto Alegre e Recife, e seja contemplada com um mero escritório de... de S. Paulo? Como pode propor-se extinguir Bilbao, Sevilha e Vigo, e se deixam intocáveis Barcelona e Madrid? A defesa dos interesses portugueses e a cooperação transfronteiriça só se fazem na Catalunha e em Castela (onde há uma embaixada ao lado), mas não no País Basco, na Andaluzia e na Galiza?
1. O Ministério dos Negócios Estrangeiros já estava previamente informado sobre o alegado envolvimento do cidadão português Armando Carlos Costa Oliveira no processo de investigação da Comissão Independente de Inquérito ao programa das Nações Unidas “Petróleo por Alimentos”. Neste sentido, a pedido do Ministério dos Negócios Estrangeiros, efectuado há cerca de 6 meses, as autoridades judiciárias portuguesas estão a acompanhar o processo em causa, bem como a colaborar com as competentes autoridades de investigação internacionais.
2. O Ministério dos Negócios Estrangeiros apenas no final do dia de ontem, na sequência da publicação do relatório final da Comissão Independente de Inquérito ao programa das Nações Unidas “Petróleo por Alimentos”, teve conhecimento do alegado envolvimento do cidadão português Rui Cabeçadas de Sousa. A natureza do envolvimento deste cidadão português no caso das violações ao regime de sanções aplicado pelas Nações Unidas ao Iraque será, desde já, analisada em pormenor pelas autoridades nacionais competentes, estando, também neste caso, o Governo português inteiramente disponível para colaborar com as competentes autoridades de investigação internacionais.
3. O relatório da Comissão Independente de Inquérito ao programa das Nações Unidas “Petróleo por Alimentos” está disponível para consulta no seguinte endereço electrónico: http://www.iic-offp.org/documents/IIC%20Final%20Report%2027Oct2005.pdf
Será por isso que LA, no seminário diplomático, se esqueceu de referir a Ásia, designadamente a China e Índia?
Confiemos então no Ministério Público, como no caso "oil for food" que correu nos tribunais franceses sem consequências em Portugal, ou se houve consequências ninguém terá sentido. LA parece ainda não ter compreendido que uma coisa é a separação de poderes e outra os poderes da separação.
O resto é conversa.
«Também eu!», dirão milhões de portugueses, alguns dos quais, por serem independentes, livres e incomodamente sérios, para além de não aproveitados, são rejeitados.
No caso do MNE isso deve-se, quase de certeza, a que só em fins de 2006 tenha sido processada a actualização 2005 (com retroactivos), além da do próprio ano, e ao facto de terem sido activadas as novas embaixadas e os novos consulados, onde precisamente só trabalham contratados a termo certo (cerca de 50).
NV que de há muito preparam um índice de sites de embaixadas na coluna ao lado, obviamente que vão colocar links para o site e para o blogue da Embaixada em Brasília, mesmo antes da lista terminada e verificada.
A Embaixada do Japão em Lisboa dá conta atempada da iniciativa nipónica Japan - Europe Mutual Understanding Scholarship Program 2007 e que pode interessar sempre a alguém que espreite NV. Trata-se de um programa do Governo do Japão para jovens entre os 16-17 anos com a possibilidade de permanência no Japão durante 5 meses. Durante esse tempo, os jovens frequentarão a escola japonesa, viverão com uma família japonesa e terão a oportunidade de viajar e experimentar diversas actividades no Japão. Informações sobre este programa poderão ser recolhidas na página da embaixada nipónica na capital portuguesa que é uma coisa que a embaixada de Portugal em Tóquio não tem e deveria ter - há por lá um site do ICEP que faz sites como quem reproduz os três moinhos activos que restam em Porto de Mós. (Na foto, o embaixador do Japão, Hara Satoshi)
Ora, quando para formular uma pergunta destas é necessário reecorrer ao anonimato, estamos perante sinais dos tempos. É que parece haver já de facto, no poder, gente com uma polícia de opinião renascida no fundo da alma.
Por que razão se propõe extinguir o consulado em Durban, a centenas de milhas de Joanesburgo, e não se toca na secção consular da Embaixada em Pretória, ali mesmo ao lado de Joanesburgo e com boas auto-estradas, se António Braga até já enviou o seu adido social da embaixada para Joanesburgo?
Perguntam-nos o embaixador Sam e o conselheiro Mariposa (mas que nickname!...) se as onze prendas de Natal que ficaram por entregar se eclipsaram. Claro que não se eclipsaram e resolveremos a questão de uma assentada. Temos pouco espaço para armazenar prendas e sobretudo a destinada a Luís Amado atravanca.
Primeiro, foram as contrariedades - todos as temos e a cada um chega a sua vez. Depois, não há que esconder, foi uma sensação de desapontamento – afinal, o que adianta alguma preocupação sobre a política externa portuguesa, o que se ganha com algum escrutínio da acção diplomática e da actuação dos seus agentes? E que avanço há com alguma preocupação também com os serviços consulares, por tradição talhados como o alfaiate talhava o fato, mais curto para perna curta, mais comprido para perna comprida, confinado ao tecido e à medida do cliente, quando a malha consular em vez de ser tesourada com um fato da fazenda da Nação, deveria ser pensada e avaliada como estratégia de Estado, estratégia que é a pele do Estado e não o seu fato?
Sem excepção, todos os que têm desfilado pelas Necessidades com o ceptro político nas mãos (uns com ceptro circunstancialmente efémero, outros, como é o caso presente da maioria absoluta, com esse ceptro tão colado ao corpo como o espírito santo à santíssima trindade) todos têm repetido essa declaração de bom tom sobre a abertura à crítica e com sublinhados para o diálogo, mas na hora de confronto com a emenda do que deve ser emendado, perdem esse verniz que a sobrevivência política em democracia aconselharia a não deixar que estale. Sem dúvida que estamos desapontados com esta política externa quase reduzida ao protocolo, sem golpe de asa, processional, ou, por outras palavras, reduzida ao bom comportamento – à imagem pública do bom comportamento, em função da qual se sacrifica a crítica, o diálogo e a emenda. E quando tudo isto se sacrifica, é quando começa a nascer lá no fundo da alma o desejo de uma polícia de opinião, ainda que, por pudor, esse feto que não aborta da sociedade portuguesa, se mantenha invisível.
Todavia porque, por razões insondáveis e apenas por um motivo bem claro – o de se recusar ser bobo da corte -, ao desapontamento se segue a inquietação, vamos prosseguir. Mas que cheira já a verniz estalado, lá isso cheira.
Carlos Albino
Aconteceu porque tinha de acontecer. E aconteceu de tudo. Passou. E assim Notas Verbais retomam a normalidade. Após umas rondas pelas Necessidades, por Belém, por algumas missões e consulados, cá estaremos se não houver mais algum daqueles inesperados que obrigam mesmo a parar.
Que todos os nossos leitores tenham um Bom Ano de 2007 e que a prova dos nove a esta parcela temporal que dá zero não seja mau presságio.
C. A.