30 setembro 2003

Martins da Cruz soma pontos... na OSCE de Seixas da Costa

A presidência holandesa da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa) decidiu, em Viena, atribuir ao diplomata português Carlos Durrant Pais o lugar de chefe da Missão da OSCE na Macedónia, a mais antiga das 18 missões que a organização mantém no terreno. Trata-se de um cargo de grande prestígio internacional, que vem coroar o trabalho desenvolvido por Portugal no seio da OSCE, nomeadamente desde a presidência portuguesa da organização em 2002 e na actual Troika, de que o nosso país faz parte. A partir de Bruxelas, Martins da Cruz que em primeira mão mas a seco deu a notícia a seco ao Expresso on line, soma assim diplomaticamente pontos preciosos e razão teve em elogiar publicamente a lealdade de Seixas da Costa, em Dezembro, no Porto. Portugal, após o ano da presidência, ocupa até final do ano, um lugar na troika da organização.

Notas Verbais avançam:

  • O embaixador Carlos Pais, que coadjuvou Seixas da Costa na direcção da presidência portuguesa da OSCE em Viena, em 2002, entrou para o MNE em 1975 e prestou serviço sucessivamente em Bagdade, Marselha, Estrasburgo, Rio de Janeiro e Viena.

  • A Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) mantém actualmente 18 Missões em países onde persistem situações de instabilidade ou conflito mais ou menos latentes, acompanhando a sua evolução e prestando assistência às autoridades locais na realização de reformas estruturais e institucionais.

  • Em Setembro de 1992, a OSCE (que na época ainda se denominava Conferência para a Segurança e Cooperação na Europa – CSCE) abriu uma Missão na Antiga República Jugoslava da Macedónia (ARJM), sediada na sua capital, Skopje. Tratou-se da primeira Missão da Organização no terreno, e o seu estabelecimento decorreu directamente do conflito que então grassava na região dos Balcãs, resultante da desintegração da Jugoslávia, e teve como objectivo evitar que o mesmo alastrasse para o Sul da região, através da monitorização das fronteiras e do aconselhamento às autoridades de Skopje.

  • Anos mais tarde, a crise que eclodiu na Macedónia, em 2001, e o subsequente acordo de paz assinado em Ohrid, em Setembro do mesmo ano, levaram a um substancial reforço do papel e das competências da Missão OSCE no país (bem como a um correspondente aumento da sua dimensão). A sua acção passou a centrar-se na sustentação da estabilidade no país, através do apoio institucional à formação de uma sociedade multiétnica, numa desejável coexistência pacífica entre eslavos macedónios, albaneses e outras etnias.

  • Na prática, e mantendo sempre a vertente de acompanhamento da situação no país, o trabalho da OSCE na Macedónia assenta em projectos concretos de apoio às autoridades, com a finalidade de garantir uma equilibrada representação étnica na administração pública, Forças Armadas e no poder local, projectos na área da comunicação social e educação, e – talvez a principal e melhor sucedida actividade da Missão OSCE – a formação, treino e modernização das forças policiais.

  • A Missão OSCE em Skopje – considerada uma das histórias de sucesso da OSCE – desenvolve a sua actividade em estreita coordenação com as outras organizações e instituições internacionais presentes no país. Em particular, a articulação com a União Europeia – cuja presença na Macedónia vem sendo reforçada e alargada a numerosas áreas – assume uma importância crescente no âmbito do processo de aproximação do país às estruturas europeias e euroatlânticas. Por outro lado, e apesar dos progressos registados, a persistência de focos de instabilidade e a ocorrência ainda frequente de incidentes – em que as motivações étnicas muitas vezes se confundem, como é apanágio dos Balcãs, com cenários de crime organizado – continuam a justificar uma presença internacional coordenada e empenhada na promoção de uma estabilidade e prosperidade duradouras no país.
  • 29 setembro 2003

    Seixas da Costa II - o compromisso para Londres e decisões sem honra

    Para terminar a incómoda questão.

    Para NV tanto importa que Seixas da Costa regresse a Nova Iorque ou que de lá tivesse saído para Nova Delhi em vez de Viena/OSCE, como aconteceu. Mas seguramente o que muito, muito mesmo, nos preocupa é o procedimento das instituições do Estado, ou melhor: dos titulares.

    Por isso, o caso do Embaixador Seixas da Costa merece reflexão, designadamente o episódio virtual da sua «ida» para Londres como chefe da missão portuguesa junto do Reino Unido e que, custa-nos a acreditar, em vez de prefigurar uma Razão de Estado acaba por ter que ser vista como Brincadeira de Estado.

  • Algum tempo após a decisão do Governo em fazer saltar Seixas da Costa de Nova Iorque, soube-se que, afinal, teria havido um acordo entre o embaixador e o Governo que encerraria a questão: depois da prestação em Viena à frente da Representação junto da OSCE, a embaixada de Portugal em Londres ficaria reservada para o diplomata – embaixador full rank – supostamente a partir de Fevereiro de 2004, momento em que se previa que o titular abandonaria funções.

  • Ficou sabido que o acordo do Governo com Seixas da Costa foi nomeadamente validado pelo Presidente da República a quem, sob proposta do Governo, compete nomear e exonerar os chefes das Missões Diplomáticas bilaterais.

  • Estavam assim compreendidas na íntegra algumas coincidências: o entusiasmo de Seixas da Costa pela OSCE, os elogios públicos de Martins da Cruz ao trabalho do embaixador e a forma como airosamente Jorge Sampaio se distanciou algo satisfeito do diferendo. Ao saberdo acordo, o PR amainou o tom de crítica à decisão governamental de afastar Seixas da Costa de Nova Iorque, pelo que Jorge Sampaio se tornou em garante do cumprimento do acordo cujo teor, de resto, Martins da Cruz assumiu em declarações pùblicas.

    Só que:

    1 – o Governo não cumpriu o compromisso da colocação de Seixas da Costa na Missão junto do Reino Unido, propondo outro diplomata para Londres;

    2 – o Presidente da República que era o garante do acordo, silenciou-se e procedeu sem escrutinar o processo.

    É difícil imaginar-se total ou mesmo alguma solidariedade, neste caso, entre o diplomata Martins da Cruz (embaixador full rank e MNE) e o político Durão Barroso (ex-MNE e agora primeiro-ministro).

    Não é difícil mesmo supôr-se tensão entre os gabinetes do PM e do MNE. Barroso não pode obviamente obrigar Martins da Cruz a dar a cara por decisões sem honra.

    Menos difícil será avaliar como Jorge Sampaio usa uma competência própria em matéria de relações internacionais. Não usa.
  • Mas quem disse o contrário?

    Muito embora Notas Verbais não sejam caixa de correio do vasto anonimato que suporta o sistema de «paredes com ouvidos» do Palácio das Necessidades, há comentários cujo registo é um dever. É o caso do que se segue:

    O tom justo
    Embora não concordando com os métodos queirosianos das bengaladas, o Embaixador Silveira de Carvalho tem algumas contas a ajustar com as "Notas Verbais" antes de ir para o Canadá. De resto a nova geração do Ministério dos Negócios Estrangeiros está ciente que pela primeira vez um Director Político marcou o tom.
    Com efeito, o Embaixador Silveira de Carvalho conseguiu afirmar-se na nova União Europeia, como se sabe em processo de alargamento acelerado, e fazer a ligação às novas gerações. Tendo na sua dependência funcional o Gabinete de Assuntos Económicos imprimiu à diplomacia económica um novo élan. Por outro lado, nunca as relações com o Ministério da Defesa foram tão boas.
    O "amigo" Seixas da Costa foi sempre olhado de través pelo Poder Político pelo que lhe são assacadas responsabilidades concretas nos casos Costa Neves e Cutleiro.
    Mesmo de forma sucinta, a verdade deve ser reposta.
    "Honni soit qui mal y pense!"

    KN


    NV: Mas quem disse o contrário? Correm as mais diversas versões no Palácio das Necessidades sobre o «caso» Silveira de Carvalho. Uma dessas versões dá conta de que o embaixador acabou por ser o «bode expiatório» de uma tensão entre o gabinete de Durão Barroso e o MNE. Duvida-se. Naturalmente que nunca NV questionaram o nível profissional de Silveira de Carvalho que se manteve ainda bastante tempo com Teresa Moura após a saída de Seixas da Costa do Governo.

    27 setembro 2003

    Portugal, lição da OSCE, proposta na ONU...

    Da ida de Durão Barroso ao Debate Geral da Assembleia das Nações Unidas, o que ficou retido foi a proposta portuguesa para que venha a ser criada uma Comissão para a Prevenção de Conflitos, no quadro da organização mundial, designadamente na adjacência do Conselho de Segurança. É uma proposta válida, diga-se, muito embora se saiba no que as comissões da ONU normalmente resultam: o impasse. Veja-se, a título de exemplo, o que acontece na importantissima Comissão para o Desarmamento – o bloqueio dos trabalhos parece ser o único ponto consensual da agenda dos próprios trabalhos, desde há vários anos...

    Todavia, importa sublinhar que a proposta levada por Durão Barroso para Nova Iorque não tem novidade. Foi certamente «bebida» do sistema da OSCE, de cuja presidência, em 2002, Portugal se desempenhou bem, ganhando credibilidade. Para tanto, Martins da Cruz contou com o profissionalismo e - porque não dizer? – com a colaboração leal de Seixas da Costa a quem o Ministro pedira «tudo» no último semestre da mesma presidência. E como lealdade com lealdade se paga, Martins da Cruz elogiou publicamente (Dezembro de 2002, no Porto) e com inusitada insistência, a sagacidade negocial, o mérito, o magnífico trabalho e o empenho constante de Seixas da Costa. «Excelente embaixador», disse o ministro certamente sabendo que, muito acima de conflitos circunstanciais mas inevitáveis na frente política, a auto-estima de um País ganha-se mais com a confiança desse mesmo País na sua frente diplomática e na coesão da actividade externa do Estado.

    À flata de mais e melhor, Durão Barroso fez bem apresentar em Nova Iorque uma proposta a que subjaze um capital de credibilidade da diplomacia portuguesa. E fez também em não fazer alarde deste capital, porque também não se vê onde está a continuidade que se esperava da experiência da OSCE. Mas isto será tema para outro comentário.

    21 setembro 2003

    Seixas da Costa I: a candidatura para Nicósia, 27 mil euros/mês...

    Sem dúvida, é intrigante a recusa do Embaixador Seixas da Costa em aceitar a candidatura «ganhadora» para o cargo de Enviado Especial da União Europeia para o Médio Oriente. E mais intrigante passou a ser o silêncio que se seguiu à recusa, apenas quebrado por uma ou outra especulação menor para o caso. Seixas da Costa remeteu-se ao silêncio, o MNE ao silêncio se remeteu e, de modo geral, o assunto «passou» para a opinião pública como uma «derrota» da diplomacia portuguesa. Certamente que muitas causas estarão a ser confundidas com os efeitos. Vamos tentar deslindar o caso, até para desfazer um equívoco: não é um «emprego português».

    1 - O cargo de Enviado Especial da UE para o Médio Oriente faz parte da lista de ambições justificadas: 27 mil euros mensais (mais ajudas de custo), um Falcon 50 à disposição e staff qualificado.

    2 – A base operacional e logística do Enviado Especial é Nicósia (Chipre) mas porque, pela natureza de funções se integra no chamado Quarteto (juntamente com os representantes dos EUA, Rússia e ONU), as viagens são constantes, daí o Falcon 50.

    3 – Em função da relevância mundial da questão do Médio Oriente, a figura do Enviado Especial pode estar sujeita a uma das mais altas exposições na cena internacional. Se o Enviado Especial se auto-reduzir a «funcionário de Bruxelas», limitando-se a cumprir no campo negocial as instruções da UE, a exposição será menor, e se for um «funcionário por inteiro», sem criatividade no terreno e voz própria, a exposição será mesmo nula.

    4 – Quem era o Enviado Especial antes da «hipótese» Seixas da Costa? Desde 1996 que o cargo estava a ser desempenhado pelo espanhol Miguel Moratinos. E entram aqui os arquivos próprios de Notas Verbais: Seixas da Costa esteve no centro da nomeação do diplomata espanhol, no momento em que os Acordos de Oslo pareciam ter vida própria e quando a União Europeia ocupava um lugar determinante no Quarteto, importância que foi sendo esbatida à medida que os EUA foram passando a liderar o «Roteiro para a Paz». A frustração de Miguel Moratinos, na parte final do desempenho, era total precisamente pela quebra de importância da UE nesse processo.

    5 – Como surgiu a hipótese da candidatura recusada por Seixas da Costa? Sabe-se que, para suceder a Moratinos, o nome de Seixas da Costa foi inicialmente sugerido pela roda de Solana. A sugestão chegou naturalmente ao conhecimento de Lisboa que acolheu. Seixas da Costa tinha um capital de confiança na alta esfera da «diplomacia europeia» e pela confluência do apoio tácito de Solana e do acolhimento de Lisboa, não foi difícil conseguir as desistências de uma meia-dúzia de outras candidaturas que se perfilavam. Foi assim que, em sede de Conselho Europeu, o nome de Seixas da Costa recolheu o que um candidato mais deseja em qualquer lugar do mundo: unanimidade. Só que, desde o primeiro momento em que o processo tomou forma, Seixas da Costa recusou, sem reservas, a candidatura.

    6 – Chegamos assim ao ponto da questão: porquê? Razões pessoais? Razões de ordem funcional? Razões políticas, designadamente as que se prendem com o afrouxamento da relevância da União Europeia no Quarteto onde os EUA é que dão música?

    7 – Naturalmente que as razões pessoais são do foro pessoal e mesmo que não sejam para aqui chamadas, não sabemos nem Seixas da Costa, ao que se sabe, alguma vez as invocou ou descreveu. Em todo o caso, é lícito excluir qualquer considerando de ordem remuneratória: 27 mil euros/mês, ajudas, Falcon, staff... não é coisa que se recuse de ânimo leve. Mas também é lícito colocar aqui um «pequeno pormenor»: é que Seixas da Costa, no caso de ter aceite o lugar em Nicósia, teria que sair da Carreira Diplomática Portuguesa transitando para uma organização internacional. E o pormenor não é pequeno pois estará directamente relacionado com a «história» da promessa que recebeu a chancela de Jorge Sampaio, da sua colocação em Londres, como Embaixador de Portugal no Reino Unido a partir de 2004, compromisso que, como se sabe, não foi honrado. Separadamente, iremos falar deste «pormenor».

    Portanto, quanto a razões pessoais relevantes, pode ficar eventualmente retido que Seixas da Costa não quis abandonar a Carreira, trocando-a por um cargo em organização internacional.

    8 – E bate a bota com a perdigota, pelo que passemos às razões políticas. A frustração de Moratinos era de molde a influenciar a decisão de qualquer candidato de elevado perfil. Aceitar o cargo equivaleria a aceitar uma herança pesada, muito embora bem paga. A União Europeia em 2003 não tem a importância que tinha em 1996, no processo do Médio Oriente que, também, não corresponde a uma vertente estratégica, prioritária e crucial da política externa portuguesa (contrariamente ao que sucede com a Espanha que tradicionalmente tem ou exibe ter interesses marcantes na matéria). Não será um Enviado Especial em Chipre a inverter a marcha, protagonismo e conteúdos da chamada Política Externa da UE. O Enviado assim pouco mais será que um Chegado. Portanto, nada disto teve a ver com a propalada «derrota da diplomacia portuguesa» no caso, como Ana Gomes por aí andou a dizer sem fundamento. Seixas da Costa não quis, foi só isso e foi isso que a principio comunicou, como se sabe nas Necessidades. Porque não quis abandonar a Carreira Diplomática mesmo por um preço tentador? Presume-se que sim, está no seu direito e se Seixas da Costa alguma vez entender explicar se foi isto, que explique, não vamos falar por ele. Nós apenas presumimos, pelos fundamentos que a frustração de Moratinos reforça. Mas resta ainda outra ordem de possíveis razões.

    9 – As razões operacionais, funcionais, como se queira. Ora bem: num cargo de tal importância, uma personalidade oriunda de um pequeno Estado, deve contar à partida com o apoio constante do seu Governo. As falhas de Bruxelas são muitas e repetidas. Mas quem acredita que Seixas da Costa teria esse apoio constante de Lisboa com o que se passou desde Nova Iorque e Viena até ao incumprimento do compromisso para Londres? E se Seixas da Costa entrasse em conflito funcional com Bruxelas (o que não seria difícil antever, dada a inanição da UE), qual seria o apoio de Lisboa para ele regressar à Carreira? Se o compromisso com Londres não foi honrado, regressaria? E em que moldes? É quase irrecusável aceitar que precisamente esta ordem de razões terão pesado na recusa de Seixas da Costa, relevando-se mais uma vez que essa recusa nada tem a ver com uma «derrota da diplomacia portuguesa».

    10 – Obviamente que o ex-Director-Geral de Política Externa, Silveira Carvalho, sabe mais do que nós sobre isto. Obviamente também, a «unanimidade» conseguida no Conselho Europeu em torno do nome de Seixas da Costa, seria impossível repetir com a candidatura de Costa Neves. Nem com 16 idas a Fátima, uma por cada Estado membro mais uma por Solana.

    Médio Oriente – Posições Portuguesas

    O prometido é devido.

    As posições portuguesas relativamente à questão do Médio Oriente, nomeadamente definidas pelo Ministro Martins da Cruz, tanto quanto se pode perceber, podem ser assim descritas:

    1 – Portugal reconhece aos Palestinianos o direito inalienável de constituírem um Estado democrático, viável e pacífico.

    2 – Acolhe a declaração da União Europeia segundo a qual a criação de um Estado Palestiniano reverte-se não só como a melhor protecção para a segurança de Israel como também em garantia de normalização das relações de Israel com os Estados vizinhos.

    3 – Repudia veementemente toda e qualquer acção terrorista, pelo que considera fundamental a existência de uma cooperação permanente no domínio da segurança entre israelitas e Palestinianos.

    4 – Portugal apoia o envolvimento dos EUA no processo de paz, enfatizando especialmente a participação directa do Presidente Bush mas realça os bons resultados obtidos pelo Quarteto (EUA, UE, Rússia e ONU). O road map, segundo Portugal, é resultado dos esforços do Quarteto.

    5 – Portugal defende como factor decisivo para o sucesso negocial, o envolvimento dos países árabes moderados da região, designadamente o Egipto e a Jordânia.

    6 – O estabelecimento de uma paz justa e duradoura, segundo Portugal, deve basear-se no princípio da «terra contra a paz», no direito de Estados e povos a viverem dentro de fronteiras seguras e reconhecidas, no respeito pelos direitos humanos, na não aceitação da anexação de territórios pela força, no respeito pelos acordos já existentes e na abstenção de medidas unilaterais que prejudiquem as negociações.

    7 – O resultado final das negociações, para Portugal, só pode ser o da existência de dois Estados, vivendo pacificamente lado a lado, em segurança e dentro de fronteiras reconhecidas.

    8 – As questões do «Estatuto Final», designadamente a questão dos refugiados, Jerusalém e fronteiras, devem ser, segundo Portugal, negociadas directamente entre as partes até 2004/2005, como está previsto na Terceira fase do road map. Partes terceiras devem limitar-se a criar condições para que as negociações sejam bem sucedidas e intervir apenas a solicitação das partes directamente envolvidas.


    A rigor e sem considerandos, é o que se sabe.

    Os Espanhóis é que «descongelam» Olivença

    Está Portugal sossegado e sem qualquer contencioso internacional «na agenda política e diplomática» e eis que a Espanha em peso se enerva, pelo menos politicamente, quando se apercebeu que a CIA colocou a questão fronteiriça de Olivença no longo relatório anual de disputas, diferendos e conflitos entre países a começar pelo A de Afeganistão e a acabar com o Z de Zimbabwé, onde não escapa até o contencioso territorial dos EUA com o Canadá. A Agência norte-americana fez esse acrescento em Agosto, mencionando a questão com iguais termos quer no quadro de Portugal quer no de Espanha que exibe um apreciável somatório de problemas.

    O assunto foi noticiado com relativa modéstia pela comunicação social portuguesa, e das autoridades de Lisboa apenas se registou um ou outro comentário lacónico, mais próximo do temeroso do que do cauteloso.

    Já assim não aconteceu com a Espanha que não foi por meias medidas. Do extenso relatório da CIA, por toda Espanha, desde grandes, médios e pequenos jornais, a rádios e televisões (a matéria mereceu relevo até no nervo espanhol da Euronews), seleccionou-se dois ou três conflitos de peso, casos de Caxemira e do Médio Oriente, como termos de comparação ridicularizante da questão de Olivença e como se esta fosse questão de fazer sangue.

    Sabe-se da literatura como os espanhóis gostam de imaginar a mobilização de grandes exércitos nem que estes se componham apenas de um só velho cavalo, para lutarem contra as velas de um moinho.

    O que jamais se suporia é que o registo de uma disputa fronteiriça pela Agência norte-americana levasse o presidente da Extremadura, Juan Carlos Rodríguez Ibarra a reclamar do governo de Madrid a defesa da espanholidade de Olivença e que o alcaide oliventino, Ramón Rocha Maqueda, tenha desafiado o Director da CIA a deslocar-se ao moinho espanhol para que o Sancho Pança diga afinal onde é que há guerra...

    Sem dúvida que o presidente da Extremadura e o alcaide de Olivença deliram e, admite-se que inadvertidamente, acabaram por «descongelar» a questão fronteiriça, mesmo que a comunicação social portuguesa, sempre atenta às movidas espanholas, não tenha sentido o desagravo imaginado à espanhola perante as velas de vento da CIA.

    Há uns meses, o mesmo presidente da Extremadura, empenhara-se em repetir até à exaustão o curioso discurso segundo o qual o diferendo territorial com Portugal já não existia porque com a União Europeia tinham acabado as fronteiras... Esta tese de Juan Carlos Rodríguez levaria a que, por exemplo, toda a Espanha já fosse portuguesa e Portugal todo inteiramente espanhol. O discurso de Juan Carlos Rodríguez mudou e, talvez por sentir no peito o peso de uma das mais altas condecorações portuguesas com que o Presidente Jorge Sampaio o agraciou, muda conforme as ocasiões. Ainda em 2001 ele reclamava a Madrid a defesa da espanholidade de Olivença. Mas quem lhe atacou o moinho?

    E quanto ao alcaide de Olivença, Ramón Rocha Maqueda, antes que seja também condecorado com a Cruz de Cristo, só lhe ficaria bem se conseguisse indicar, amanhã de manhã já e um por um, onde estão os marcos de fronteira que delimitam o território espanhol do território português precisamente na vasta área da prolongada contenda histórica que, inegavelmente, é contenda territorial. Nem é preciso convidar o Director da CIA, basta a D. Ramón convidar a Comissão de Limites do Palácio das Necessidades mesmo na presença do seu compadre de Elvas. É mais barato e menos quixotesco.

    Se D. Ramón nos convidar, lá iremos, mas certamente munidos das Cartografia do Exército Português que, ao que parece, não está congelada. A não ser que também já esteja sem a gente saber. Em todo o caso, veja-se

    Carta Topográfica do Exército Português
    Série M 586 Folha N.º 6
    Escala 1:250.000
    Representa a interrupção da Fronteira no Guadiana do Caia ao Cuncos. Diferendo.

    Carta Topográfica do Exército Português
    Série M 888 Folha N.º 441
    Escala 1:25.000
    Representa a interrupção da Fronteira no Guadiana a partir do Caia. Diferendo.

    Carta Topográfica do Exército Português
    Série M 888 Folha N.º 441-A
    Escala 1:25.000
    Representa parte do Território de Olivença, incluindo a cidade como território português. Diferendo.

    Carta Topográfica do Exército Português
    Série M 888 Folha N.º 452
    Escala 1:25.000
    Representa a interrupção da Fronteira no Guadiana junto ao Cuncos. Diferendo.

    Embora saiba muito bem que a CIA se baseia em dados objectivos (mesmo para os contenciosos que os próprios EUA têm com Estados vizinhos como o Canadá e México, e que, na linguagem quixotesca, também estão equirados ao Caxemira e a Gaza...) o presidente da Extremadura, Juan Carlos Rodríguez, entendeu fazer mais uma exibição provinciana ao classificar a citação do diferendo como «uma estupidez». Está a chamar «estúpido» ao Exército Português? Rodríguez está a ir longe em demasia.



    Quem ainda tiver a paciência de verificar um pouco do reboliço em Espanha, seguem alguns endereços ainda activos. Dão uma ideia da espanholidade:

    Imprensa nacional espanhola:

    El País Digital
    13/09/2003
    http://www.elpais.es/

    El pueblo extremeño de Olivenza, un 'punto caliente' para el espionaje de EE UU
    La CIA equipara al pueblo extremeño de Olivenza con zonas conflictivas como Gaza o Cachemira


    ABC
    12/09/2003

    Un informe de la CIA cataloga a Olivenza (Badajoz) como una zona tan conflictiva como Gaza o Cachemira


    El Mundo13/09/2003

    http://www.elmundo.es/elmundo/2003/09/13/sociedad/1063453388.html

    LA LLAMA 'ZONA DE CONFLICTO INTERNACIONAL'

    Un error de la CIA asegura que España y Portugal se disputan la localidad extremeña de Olivenza


    El Periódico
    última hora Internacional
    13/09/2003
    http://www.elperiodico.com/

    Un informe de la CIA cataloga a Olivenza (Badajoz) como una zona tan conflictiva como Gaza o Cachemira

    --------------------------------

    La Razón Digital
    14/09/2003
    http://www.larazon.es/ediciones/anteriores/2003-09-15/noticias/noti_soc06.htm

    La CIA compara Olivenza con Cachemira por ser una zona «conflictiva»


    INTERVIÚ
    N.º 1.429 15-09-03
    http://www.zetainterviu.com/

    LA ÚLTIMA GUERRA DE LA CIA


    Imprensa regional espanhola:

    EL PERIODICO EXTREMADURA
    03/09/2003

    SORPRENDENTE INFORME DE LOS SERVICIOS SECRETOS NORTEAMERICANOS
    La CIA sitúa en Olivenza un nuevo e inexistente conflicto internacional


    Region Digital11/09/2003

    http://www.regiondigital.com/noticias_hemeroteca.asp?noticia=33502&tipo=Seccion&hemeroteca=si

    El alcalde de Olivenza dice que la CIA es un órgano "poco riguroso y un tanto distraído"


    CIBERDIARI14/09/2003
    http://www.ciberdiari.com/article.php?sid=3851&mode=thread&order=0

    La CIA considera a un poble de Badajoz tan conflictiu com Gaza


    HOY
    16/09/2003

    RAMÓN ROCHA MAQUEDA ALCALDE DE OLIVENZA
    «Voy a invitar al director de la CIA a que venga a Olivenza»
    El alcalde se toma a broma la noticia de que la localidad es objeto de conflicto internacional


    Imprensa de língua inglesa:


    PANORAMA Gibraltar's online daily
    16/09/2003

    http://www.panorama.gi

    The CIA recognises the Olivença dispute between Portugal and Spain


    Thestatesman
    15/09/2003

    http://www.thestatesman.net/page.arcview.php?clid=3&id=51382&usrsess=1

    Spain Angry Over CIA Comparison To Gaza

    20 setembro 2003

    Portugal e a questão do Médio Oriente

    E como haverá interesse em saber com o rigor possível qual a posição de Portugal sobre a questão Israel/Palestina, prometemos ainda para hoje, Domingo já... antes de Portugal/Líbia, de Portugal/Turquis e antes mesmo que Medeiros Ferreira se ofereça como voluntário.

    O voto de Portugal em Nova Iorque

    Sobre a questão colocada por Bloguítica, e que a Lusa não referiu, diga-se:

    O voto de Portugal em Nova Iorque relativamente à proposta apresentada pelo Sudão em nome do Grupo de Estados Árabes para que Israel renuncie à decisão de expulsar Arafat e se abstenha de qualquer ameça à sua segurança, foi de alinhamento com a União Europeia que introduziu uma emenda no preâmbulo da proposta assim aprovada por 133 votos, contra 4 (EUA, Ilhas Marshall, Israel e Micronésia) e 15 abstenções (Austrália, Camarões, Canadá, Colômbia, Fiji, Guatemala, Honduras, Quénia, Nauru, Nicarágua, Papua-Nova Guiné, Paraguai, Peru, Tonga e Tuvalu).

    A resolução exprime o apoio sem reservas ao chamado Quarteto.

    Registe-se que as emendas apresentadas pela UE foram apoiadas pelo Sudão (proponente).

    A posição da UE explicitada pelo Representante Italiano, Marcello Spatafora que lamentou que o Conselho de Segurança não tenha adoptado por consenso uma resolução contra a decisão de Israel. A UE fez notar que tinha incluido o braço político do Hamas na sua lista de organizações terroristas.

    O Canadá, por exemplo, justificou a sua abstenção alegando que a resolução não exorta suficientemente a Autoridade Palestiniana a lutar contra a violência terrorista dos grupos armados do Hamas, Djihad e Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa.

    Cuba denunciou «a hipocrisia» da UE alegando que emendas europeias condenam «as execuções extrajudiciais e os atentados terroristas, sem tomar em linha de conta o direito do povo palestiniano à resistência». De Cuba não se esperaria outra coisa.

    Logo a seguir, outro dá conta do estilo e do ambiente

    A última mensagem a entrar na caixa de correio, no melhor estilo dos telegramas:

    «VOCÊS E AS NOTAS VERBAIS VÃO ACABAR POR TER UM LINDO ENTERRO ! E COM INSULTOS COMO FIZERAM AO EMBAIXADOR SILVEIRA DE CARVALHO, UM DOS MAIORES DIPLOMATAS QUE A CASA TEVE NAS SUAS CHEFIAS, AINDA ACABAM EM TRIBUNAL OU COM UMAS BENGALADAS NOS CORNOS. »

    Vem um e diz isto

    A penúltima mensagem a entrar na caixa de correio:

    O seu blog está a criar uma nervoseira fantástica no Rilvas. Já estão a querer acabar com a Internet nos computadores pessoais, o que prova que a coisa «está a doer»

    Bruxelas 10. Que o interesse nacional diga se não é verdade

    E foi assim a história do DG português que se perdeu em Bruxelas. Nela se juntam alguma ingenuidade, uma certa indecisão e, muito provavelmente, muita má fé por parte das instituições comunitárias. Sem dúvida, mas a «diplomacia comunitária» portuguesa há muito que tinha a obrigação de saber o que a casa gasta.

    A António Guterres e ao seu governo poderão ser assacadas culpas por alguma inabilidade e excesso de confiança, ao não terem acautelado, em absoluto, que à saída de António Cavaco corresponderia de imediato um outro DG para Portugal. E ao não terem tido a coragem de arrostar com uma crise política interna, com o PSD, para assegurar a preservação do interesse nacional.

    Mas as culpas principais não lhe cabem. Foram a insensata insistência no «rotativismo» por parte dos sociais-democratas e as indecisões, temporalmente fatais, do líder do então principal partido da oposição, Durão Barroso, que acabaram por estar também na origem da presente situação.

    Bruxelas 9. Que o comissário Likannen diga se não é verdade

    O processo volta à estaca zero. 48 horas depois, Durão Barroso avança, finalmente, com o nome de Eduarda Azevedo, porta-voz do PSD para a área europeia, cujo currículo agrícola consistia numa passagem pela direcção do gabinete jurídico do Ministério da Agricultura e a autoria de uma publicação sobre a Política Agrícola Comum. Com o apoio do governo socialista, o nome de Eduarda Azevedo foi proposto a Bruxelas para o cargo de DG da Agricultura. Acabou por ser preterida pela candidatura de uma personalidade de outra nacionalidade, que há vários anos desempenhava as funções de Subdirector-Geral da Agricultura dentro da Comissão.

    Perdida essa ronda de nomeações, António Guterres e o seu governo continuaram a insistir em Bruxelas pela nomeação de um DG português. Sem sucesso.

    Chegado ao Governo, Durão Barroso seguiu a mesma linha. António Cabral, por mérito próprio, acabaria por ir a subdirector-geral e, também como consagração de uma carreira interna que pouco ficou a dever aos diferentes governos, Jorge Oliveira e Sousa subiu ao cargo de Director-Geral. Valha a verdade, o Governo Barroso nada teve a ver com essa nomeação, que Oliveira e Sousa (meio-belga, meio-português) deve, em grande parte, à protecção do Comissário Likannen.

    Bruxelas 8. Quando surge a hipótese António Cabral

    Por entre as figuras portuguesas da Comissão, um único nome recolhia um certo apoio nessa instituição: António Cabral. Não sendo militante do PSD pertencia, contudo, à area política social-democrata e era amigo pessoal de Cavaco Silva. Dada a crescente pressão do tempo – haviam já passado dois meses e as novas nomeações para DGs estava à porta – houve dentro do governo pressões para que Guterres indicasse o nome de Cabral e procedesse como Cavaco Silva havia feito: indicava uma figura da área do principal partido da oposição e informava disso o respectivo lider. Com a diferença que, desta vez, não tinha a certeza de conseguir fazer vingar o nome.

    Guterres terá dito «eu não sou como Cavaco Silva» e, na sua consabida linha de diálogo, quis dar outras opções a Durão Barroso. Assim, entregou-lhe uma lista com cinco nomes próximos (dois seriam mesmo militantes) do PSD, tidos como dispondo de suficiente estatuto no «ranking» comunitário para poderem ter ambições de ser DG. Tratava-se, reconhecidamente, do melhor conjunto de nomes possíveis na área social-democrata e era encabeçado por António Cabral, verdadeiramente o único que a Comissão indicara informalmente como podendo vir a aceitar.

    O tempo era escasso. O lider do PSD recebeu a lista na segunda semana de Setembro. A crise de Timor e a pré-campanha eleitoral para as legislativas meteram-se pelo meio. Em meados de Outubro, indicou formalmente a António Guterres que a sua escolha seria, afinal, Sevinate Pinto, o antigo director na DG da Agricultura que anos antes saíra por vontade própria de Bruxelas. Um nome de qualidade, mas que vinha já tarde como hipótese externa. Confrontado pelo governo com esta indigitação, o actual ministro da Agricultura terá manifestado... a mais profunda surpresa: não havia sido contactado por Barroso e não estava disponível.

    Bruselas 7. Que Carlos Costa diga se não é verdade

    O lugar específico para o qual convergiu o interesse português foi o de DG da Agricultura, pelo facto de os restantes postos em aberto terem já como que candidatos «naturais» na Comissão – todos, aliás, viriam a ser ocupados por funcionários do quadro da Comissão, como, de resto, sucede desde há vários anos.

    As mensagens recebidas pelo governo português da Comissão tinham um ponto comum: nada podia ser garantido se a personalidade a designar não fosse aceite como uma escolha natural pelos seus pares, o que praticamente equivalia a ter de seleccionar uma pessoa oriunda dos quadros da própria Comissão. Tal não era dito, mas estava implícito.

    Guterres começou por testar internamente o nome de Carlos Costa, chefe de gabinete do comissário cessante, Deus Pinheiro. Talvez por essa qualidade, Durão Barroso opôs-se firmemente a que fosse tentada tal candidatura – das poucas de origem exterior que talvez tivessem possibilidades de vingar, por ser uma figura bastante prestigiada em Bruxelas e com um trabalho reconhecido há muitos anos na máquina comunitária.

    Bruxelas 6. Que Jorge Braga de Macedo diga se não é verdade

    Portugal tinha ainda um outro factor em seu desfavor. Dispunha, teoricamente, de um outro lugar A1, dito «à titre personel», que Jorge Braga de Macedo deixara quando veio para ministro das Finanças e que não se mostrava interessado em ocupar; só encarava sair de lhe atribuíssem o valor da elevada indemnização conhecida como o «Artigo 50.º», o que a Comissão sempre lhe recusou. Assim, e por opção pessoal, Macedo privava o país de um lugar no topo da hierarquia comunitária (só ele pode ocupar esse lugar) e dava acrescida razão aos que afirmavam que Portugal excedia já a sua «quota».

    Pressionado pelo PSD, que reclamava o afastamento de António Cavaco para nomear um DG da sua confiança política, o governo de António Guterres fez insistentes diligências junto dos serviços da Comissão, a começar pelo próprio Prodi, envolvendo o novo comissário que tinha a seu cargo as questões de pessoal, Niel Kinnock. Pretendia garantir que, com a saída de António Cavaco para o gabinete de Vitorino, Portugal continuava a ter direito ao «seu» DG.

    Bruxelas 5. Que António Cavaco diga se não é verdade

    O Governo, entretanto, pedia um duplo sacrifício a António Cavaco: obrigava-o a sair de um cargo a que ascendera com indiscutível mérito profissional e, praticamente, forçava-o a aceitar ser chefe de gabinete de António Vitorino, que se dizia ter outras ideias para o lugar. Mas, ao «sair para o lado», António Cavaco, embora deixando de ser DG, mantinha o seu lugar de funcionário «A1» – a categoria mais elevada da estrutura comunitária. Se Portugal nomeasse outro DG, ficaria com um segundo lugar de A1, o que equivalia a ultrapassar, por exemplo, a «quota» de que a Irlanda então dispunha.

    Ora aqui residiu uma resistência específica que viria a mostrar-se decisiva. O chefe de gabinete escolhido por Prodi, o irlandês David O’Sullivan (hoje secretário-geral da Comissão), era o único DG da sua nacionalidade e, ao sair para aquele lugar, não queria que fosse nomeado nenhum outro DG irlandês, por recear nunca mais recuperar tal lugar: parecia preferir que a Irlanda ficasse sem um DG por algum tempo (recorde-se que a Comissão Prodi só viria a obter a sua confirmação pelo Parlamento Europeu no último trimestre de 1999 e que este debate se passa entre Julho e Setembro) e não correr o risco de, se de repente tivesse que regressar à estrutura normal da Comissão, perder o seu anterior lugar de DG. Os receios de O’Sullivan não se concretizaram e hoje a Irlanda tem 3 Directores-Gerais !

    Bruxelas 4. Guterres, o «pacto» da rotatividade e os avisos

    Após a crise da Comissão Santer, em inícios de 1999, a nomeação da nova Comissão foi apressada. Com a entrada de António Vitorino para Comissário, o PM António Guterres quis cumprir o «pacto» com o principal partido da oposição, cedendo a este o lugar de DG. O PSD não esquecia o «arranjo» de 1985 e enviou então vários recados ao Governo socialista, insistindo na «rotatividade» do lugar. Guterres foi obrigado a ceder, não obstante avisos de várias fontes de que tal «operação» poderia não ser entendida por Bruxelas e ter resultados nefastos para a presença portuguesa na Comissão.

    Nos contactos com a máquina comunitária sobre este assunto, emergiram, desde logo, algumas dúvidas: Portugal poderia reivindicar um lugar de DG, mas a Comissão não reconhecia o «arranjo» político interno de rotação, pelo que não se sentia obrigada a seleccionar uma personalidade da área social-democrata. A Comissão deixava mesmo a entender a sua estranheza quanto à politização e partidarização deste tipo de postos, que em outras nacionalidades não se colocava. Além disso, alguns portugueses faziam parte da estruturas da Comissão há mais de 13 anos, dispondo já de condições potenciais de ascensão, pelo que nada justificava a entrada de «paraquedistas», deslocados da capital para lugares de topo. Um certo corporativismo crescente no funcionalismo comunitário, com expressão nas suas estruturas sindicais, reforçava esta filosofia.

    Bruxelas 3. António Cavaco

    O PS sobe ao governo em 1995. Em 1997, Almeida Serra sai e coloca-se ao governo PS a necessidade de o substituir. Deus Pinheiro continuava Comissário (sairia em 1999) e os socialistas entendiam continuar, assim, a «ter direito» ao lugar de DG. Curiosamente, a pessoa reconhecidamente melhor colocada na estrutura da Comissão, entre todos os funcionários portugueses de qualquer orientação (e alguns não a tinham evidenciada), era um socialista, António Cavaco. Tinha subido por mérito próprio, não precisara de quota partidária para construir a sua carreira. Ele foi a escolha natural e, ao que os serviços da Comissão então referiram, a escolha que a própria estrutura comunitária desejaria – na hipótese de ter de seleccionar um funcionário português.

    Bruxelas 2. Que Constâncio diga se não é verdade

    Passemos à Comissão, que é o que aqui nos traz. Cavaco Silva começou por nomear Cardoso e Cunha para Comissário – o qual, curiosamente, viria mais tarde a assumir o pelouro do Pessoal e de cuja gestão os quadros portugueses muito se queixaram - e convidou o socialista Rui Vilar para DG. O lider socialista de então, Vitor Constâncio, foi apenas informado e não lhe foi dada nenhuma outra alternativa.

    Quando, anos mais tarde, Rui Vilar manifestou desejo de sair, Cavaco Silva tinha ainda a possibilidade de nomear outro DG vindo de fora da estrutura de Bruxelas. Geralmente, as instituições comunitárias concedem esta possibilidade durante um período razoável após a adesão, a fim de dar tempo aos quadros nacionais a ascenderem normalmente na máquina comunitária. Ao indicar Almeida Serra, Cavaco Silva procedeu de forma idêntica ao que antes fizera: limitou-se a informar o secretário-geral do PS, Jorge Sampaio, do nome do socialista que escolhera.

    Bruxelas 1

    Numa combinação que vinha do «bloco central», e que então seguiu práticas adoptadas noutros países europeus, PS e PSD, por ocasião da entrada de Portugal na CEE, em 1986, distribuiram entre si os cargos de Comissário Europeu e do Director-Geral (DG) a que Portugal teve direito.

    Outros lugares de nível superior ou intermédio da estrutura comunitária foram, então, destinados a cidadãos portugueses, tendo sido abertos concursos públicos, documentais e curriculares, que a prática detectou terem sido «orientados» no sentido de distribuir alguma clientela dos dois principais partidos por aquilo que veio a chamar-se a «quota» portuguesa de funcionários comunitários.

    Refira-se, a propósito, que muitos desses compatriotas ilustres, muitos dos quais saídos de governos dos partidos do «bloco central», depois de terem durante alguns anos amealhado o necessário em Bruxelas, em postos elevados das instituições comunitárias (lugares A2 e A3), viriam a abandonar tais colocações, de regresso ao governo ou a empresas públicas, criando um irrecuperável défice de presença para o país nas áreas europeias, que agora melhor se sente.

    Para se compreender Bruxelas. A propósito do Director-Geral que se perdeu.

    Tal como foi prometido, vamos à história do Director-Geral que Portugal mantinha na Comissão de Bruxelas e que acabou por perder, penalizado por indecisões e pelo resultado do jogo das pressões políticas domésticas. António Guterres, como dirá Bloguítica , poderá ficar com «as orelhas a arder. Durão Barroso, como dirá Terras do Nunca, poderá ficar a ponderar a importância que Portugal tem lá fora, exactamente no sentido que Portugal e Arredores observou.

    Quando a História se paga e exige um pagamento longo, opta-se pelas prestações. Numeradas, por regra de conveniência.

    19 setembro 2003

    Os novos conselheiros...

    Foi-nos lançado o desafio de avaliar a forma, o critério e perfil (designadamente político-partidário) dos novos conselheiros e técnicos que por aí andam a ser colocados nas Embaixadas Portuguesas. Salvo raras excepções (repita-se: excepções mesmo), os antecessores não ficaram atrás pelo que nos dispensamos do trabalho. É Portugal que perde com o critério e pouco adianta ou nada adianta repisar essa questão do compadrio e da recompensa política em detrimento de critérios técnicos, de competência e de missão. Os embaixadores sabem, melhor do que ninguém, o que Portugal perde. Perdeu, perde e perderá enquanto o critério prevalecer. Aliás, perdemos o tal Director-Geral na Comissão em Bruxelas precisamente pela ostensiva partidarização das indicações para esse desempenho.

    Incómodo nas Necessidades

    O SENEC, António Lourenço dos Santos, está incomodado porque aqui se afirmou que percebe muito de agricultura mas pouco de Negócios Estrangeiros (deixar-se desarmar em votações internacionais como se descreveu nos episódios com Silveira Carvalho, é prova disso) e nada de Cooperação. E está incomodado porque também se afirmou aqui que Martins da Cruz merece mais do que tem nas Secretarias de Estado. Em vez de nota verbal é preciso fazer nota formal sobre a matéria?

    18 setembro 2003

    Acontece...

    Nestas últimas semanas, últimos dias, últimas horas.... acontece que estalou a guerra de gabinetes ou de competências ou de actuações entre o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, António Lourenço dos Santos e o Presidente Português de Apoio ao Desenvolvimento (IPAD), o diplomata Luís de Almeida Sampaio. Lourenço dos Santos deve perceber muito de agricultura mas percebe muito pouco de negócios estrangeiros e praticamente nada de cooperação. Luís de Almeida Sampaio é um dos brilhantes diplomatas da chamada «nova geração» que está a envelhecer, percebe de cooperação e desenvolvimento, mostra sem esforço possuir um pensamento estruturado para os temas da acção externa do Estado e tem salvo muitas situações em que Lourenço dos Santos patinou. A algumas, assistimos. O resultado disto é algo de estranho para qualquer Chancelaria evoluida do Mundo mas que é já «rotina» nas Necessidades: complexo de inferioridade do secretário de Estado e ciumeira. Martins da Cruz parece não estar a gostar do panorama. O secretário de Estado é que ainda não percebeu. Interessante será o próximo capítulo. Triste diplomacia portuguesa.

    Diplomacia Económica

    Separemos as águas. Aos que nos incitam a que nos metamos pelos atalhos da Diplomacia Económica, está criado o sítio adequado. Isso mesmo: Diplomacia Económica. A matéria vai ser reactivada.

    Turquia sim, mas antes a Líbia...

    O desafio está aceite: falar desta história de Portugal-Turquia em que Jorge Sampaio se empenha tal como se empenhou em Portugal-Ucrânia (o mesmo discurso mutatis mutantis). Mas antes vamos falar do Portugal-Líbia...

    Essa tal Associação dos Diplomatas

    Notas Verbais não são seguramente um acto de excepção sediciosa contra a Chancelaria Portuguesa, ou, com mais precisão, contra os decisores políticos das Necessidades. Ainda não chegámos ao ponto de avaliar a actividade dos «MNE-sombra». Lá chegaremos, devendo então repetir-se a advertência de que Notas Verbais também não são acto de excepção sediciosa contra a sombra... E diz-se isto para que Ana Gomes fique, desde já senhora da antecipação.

    Compreende-se que muita gente interrogue Notas Verbais como se isto aqui fosse a Inspecção Diplomática e Consular (grande saia comprida, lá chegaremos) ou o Conselho do Ministério (tanto pano para mangas... lá chegaremos) ou, mais modestamente, uma secção recreativa da Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses cuja última prova de vida consistiu na posição corporativa acerca da água que sobrou do telhado no caso do Embaixador Jorge Ritto. Então, com tantos problemas nas Necessidades, dessa Associação nem sai uma minuta?

    E porquê Ana Gomes?

    A uma pergunta e questões conexas dirigida a Notas Verbais (sobre a saída de Silveira Carvalho do cargo de Director-Geral de Política Externa) já se respondeu. Essa pergunta e as questões conexas eram relevantes porque implicavam apostas estratégicas – a colocação de portugueses em postos-chave na NATO, no Kosovo e no Médio Oriente. Como se viu, nada teve a ver com o que Ana Gomes argumentou na «sombra». Disse a citada que tais apostas «acabaram por falhar porque certos aliados, de proverbial perfídia, não se compadecem com pacóvias subserviências belicistas...» A coisa foi mais simples e talvez muito menos pacóvia, termo que nestas coisas nem na sombra se tolera.

    Medeiros Ferreira resiste a oferecer-se como voluntário...

    Havia a secreta esperança em que Medeiros Ferreira se disponibilizasse como voluntário para colaborar no nosso projecto de Dicionário Diplomático, felizmente em estado avançado... Nada disso. Ele voltou a carga, na página de opinião do DN com um «Blogue II» como se Teixeira de Pascoais fosse do Século XXI. Continuamos à espera do voluntariado de Medeiros Ferreira e já agora de Ana Gomes que até agora apenas tem sido «voluntariosa» e pouco mais, o que é muito pouco.

    16 setembro 2003

    O «peso» de Portugal em Bruxelas

    Dentro da UE, a força diplomática de um Estado-membro mede-se pela presença ou presenças com que conta na Comissão. Embora seja de bom tom que todos os funcionários europeus digam e repitam que, na Comissão, são «europeus» e supostamente por isso estarão acima dos interesses nacionais, na prática toda a gente sabe que não é nada assim. Primeiro, a avaliar pelo alcance e motivações das reuniões de funcionários «nacionais» que alguns Estados membros promovem com frequência. Segundo, a avaliar pela corrida fortemente competitiva para a ocupação de postos que se compaginem com as prioridades e estratégias nacionais. E nisto, o que vale Portugal?

    Temos o comissário António Vitorino, cujo chefe de gabinete é o eng. António Servinho Cavaco mas já o chefe de gabinete adjunto é espanhol: Fonseca Murillo. Deferências transfronteiriças a que espanhóis não correspondem.

    E no patamar hierárquico inferior ao dos comissários? Aqui começam os problemas da visibilidade portuguesa a que correspondam proveitos para a nossa «diplomacia comunitária».

    Por muito tempo, Portugal ficou sem um único director-geral. O argumento improvisado para explicar o caso era manifestamente provinciano. Segundo tal argumento, a «pequenez» de Portugal justificaria o desaparecimento da presença portuguesa em qualquer das posições de director-geral. Naturalmente que este não é um problema que diga directamente respeito à populações de Trás os Montes ou de Serpa pelo que não se estranhou muito que o provincianismo da indiferença não tivesse alastrado pelos centros do poder em Lisboa. O argumento foi mesmo provinciano: a Irlanda, nesse período, chegou a ter três directores-gerais, seus nacionais...

    E foi assim que alguma comunicação social, como que para compensar a frustação mal explicada, saudou a nomeação de Jorge Oliveira e Sousa para Director Geral da Imprensa e Comunicação. Enfim, Portugal tinha um português em Bruxelas. Mas, independentemente dos serviços dessa Direcção Geral de Bruxelas em pouco ou mesmo nada se cruzarem com os efectivos interesses estratégicos do Estado Português, os quais, à cabeça, se situam nas áreas da cooperação, desenvolvimento, agricultura e pescas, um nome português apaziguou os ânimos da pronúncia. Todavia, a rigor, apesar da simpática familiaridade do nome, Jorge Oliveira e Sousa é um funcionário da Comissão meio-português, meio belga e fez estudos sempre na Bélgica como não podia deixar de ser. Portugal nada terá contra isto nem deve ter, mas seguramente não será Jorge Oliveira e Costa a convencer Trás os Montes e Serpa em que, na Comissão, há um Director-geral português. Há um, sim senhor, meio-português, meio-belga e a tutelar matérias que não se cruzam com as matérias do Estado Português. É o mesmo que não ter.

    E depois?

    Há efectivamente nos serviços da Direcção-Geral do Desenvolvimento, uma directora de Assuntos Gerais e Apoio Operacional que é portuguesa: Lília Barreiros. Em escalão mais baixo, um chefe de divisão, Luís Ritto mas que foi colocado junto da FAO, como chefe do bureau da CE.

    Na Direcção-Geral das Relações Externas, o director para a América Latina, é um português – Francisco Câmara - que também vai partir para Nova Delhi. Como chefe da Delegação da UE.

    E também na Direcção-Geral da Agricultura, está um português como director de Relações Internacionais, Comércio e Qualidade, José manuel Sousa Uva.

    Pedro Sampaio Nunes, por lá anda igualmente como director de divisão na Direcção-Geral para a Sociedade da Informação, Palma Andrés tem idêntica posição na Direcção-Geral para a Política Regional, Armindo Silva idem aspas na Direcção-Geral dos Serviços Sociais.

    Mais uns quantos, poucos funcionários sem posições de chefia e, na Comissão, Portugal acaba aqui.

    Bem, aguarda-se que Jorge Braga de Macedo chegue a Brixelas para, pelo menos, assumir uma posição de Director-Geral Adjunto. Pelo menos, Trás os Montes e Serpa sabem que Braga de Macedo não é meio-belga. Mas será Adjunto.

    Isto é muito pouco, para não dizer nada para um Estado membro como Portugal que entrou para a EU anunciado como «advogado» do Brasil, «solicitador» de uma boa parte da África e «notário» para alguma aquela Ásia que cabia em Macau...

    A razão por que a posição portuguesa foi «raptada», fica para próxima nota verbal.

    Comecemos pela questão corrente do Embaixador Silveira Carvalho

    Cumpre-nos transmitir a Portugal e Arredores e Bloguítica, sobre a questão corrente da demissão do Embaixador João Pedro de Silveira Carvalho do cargo mais importante da hierarquia do Ministério dos Negócios Estrangeiros, se descontarmos a figura do Secretário-Geral, mais vocacionada para os aspectos administrativos, o seguinte e por nota verbal:

    Silveira Carvalho foi demitido por instrução directa de Durão Barroso, contra a vontade de Martins da Cruz, e enviado para o posto menor de Embaixador em Otava (Canadá).

    O diplomata era Director-Geral de Política Externa há pouco mais de um ano, funções que lhe haviam sido confiadas pelo Ministro Martins da Cruz, de quem é amigo íntimo de há muito. Como alguma imprensa referiu, Silveira Carvalho foi uma escolha polémica para o cargo: sem dispôr de grande prestígio na Carreira, com muitas más-vontades acumuladas ao longo de anos, o seu nome estava longe de ser consensual. Entre 1998 e 2002, o seu trabalho como Director-Geral dos Assuntos Comunitários esteve longe de brilhante e a ocupação desse cargo ficou apenas a dever-se à sua amizade e protecção do então Secretário de Estado, Seixas da Costa, que o manteve em funções por razões que muitos continuam a entender como muito misteriosas. Mal Seixas saiu para Nova Iorque, o Ministro Jaime Gama enviou-o para a Embaixada em Dublin, trocando-o pelo excelente João de Vallera, que Martins da Cruz “despachou” para Berlim mal chegou às Necessidades. E Martins da Cruz foi buscar Silveira Carvalho a Dublin.

    Mas voltemos a Silveira Carvalho. Porque caiu ? Porque terá descurado a candidatura do actual Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Costa Neves, ao cargo de Enviado Especial da União Europeia para o Médio Oriente. Esta era uma “candidatura surpresa” que Durão Barroso inventou e tentou promover, depois de se ter confrontado com o inesperado “não” de Seixas da Costa ao cargo. Silveira Carvalho (para sublinhar e apoiar a atitude de Seixas?) ter-se-á mostrado pouco diligente nos contactos europeus que havia sido encarregado de fazer e o Secretário de Estado viu-se apoiado apenas pelo Luxemburgo e pela Espanha e confrontado com a nomeação de um obscuro diplomata belga para o lugar.

    Mas há mais! Silveira Carvalho tinha também como missão promover a candidatura do Embaixador José Cutileiro ao lugar de Representante das Nações Unidas no Kosovo. Sabendo-se que caberia à União Europeia a indicação do nome, era nesse âmbito que a decisão seria tomada. Acontece que, entre Silveira Carvalho e José Cutileiro há um contencioso de décadas, em que um “elemento de ordem pessoal" não é estranho. Colocar a sorte de Cutileiro nas mãos de Carvalho era uma verdadeira ironia, para quem conhece as Necessidades. O “esforço” de Silveira Carvalho para levar o Embaixador até Pristina não terá sido por aí além, antes terá deixado cair, aqui e ali, que se tratava de “um homem dos ingleses”, o que chegou aos ouvidos de Barroso. O destino de Carvalho terá ficado então marcado.

    Primeira entrada: Nota Verbal

    Nota Verbal: Uma das duas fórmulas das Notas Diplomáticas, a Nota Verbal é a mais frequentemente usada e incide sobre questões correntes de menor importância ou de trâmite comum. Normalmente é redigida na terceira pessoa, sendo endereçada pela missão diplomática aos serviços centrais do Ministério de Negócios Estrangeiros do Estado receptor, ou vice-versa.

    12 setembro 2003

    O «dicionário» está quase e a questão do «chamariz» também

    Tenham paciência, por favor.

    1 - A anunciada colocação do Dicionário Diplomático à disposição de todos está quase. Inesperadamente, recebemos uma enxurrada de correio a aplaudir. A cada um dos correspondentes foi dito que o nosso entusiasmo e empenho é grande mas o trabalho é modesto e para revisão permanente. Está quase.

    2 - A tal história do «chamariz» de Bruxelas também está para breve. Talvez neste fim-se-semana. Que a história é curiosa, lá isso é. Abrindo o pano, vamos dar relativa evidência à forma como a partidarização da escolha para altos cargos internacionais tem prejudicado a presença e protagonismo de Portugal. António Guterres será um dos primeiros a ter que colocar a mão na sua consciência.

    3 - Continuamos à espera que José Medeiros Ferreira se penitencie do que escreveu e se inscreva no voluntariado geral que lhe foi proposto.

    4 - Por entre o correio que saturou por completo a caixa electrónica, uma missiva houve que nos deixou atónitos e se refere ao cônsul honorário em Miami. Já a alguém afirmámos com clareza que Notas Verbais não existem para se substituirem à Inspecção Diplomática e Consular, mas quando parece que os princípios são postos em crise, sem dúvida que haverá mesmo Nota.

    11 setembro 2003

    Simples anúncio no Claustro

    Muito em breve, vai figurar na coluna ao lado, um endereçoo muito especial: Dicionário Diplomático. Será isto mesmo - de A a Z, as palavras e expressões usadas na actividade polí­tico-diplomática, das mais simples simples às mais complexas, para consulta permanente. Naturalmente que o «trabalho» ficará enriquecido com os contributos e o voluntariado geral (José Medeiros Ferreira, caso deixe de pensar que regressámos ao tempo do Teixeira de Pascoais, será bem vindo e pode dar preciosa ajuda em algumas letras. José Pacheco Pereira de igual modo, se dedicar a este serviço público uns dois segundos de Abrupto).

    Poder-se-á julgar que esta será uma forma como a Internet, um simples blog, pode disponibilizar o que as Necessidades não fazem e que nós também não desejamos ver distribuido ao fim de semana nesses encartes de jornais feitos por espanhóis. Nada disso e para o que será, em tempo será motivo de novo aviso a afixar no Claustro.

    As Crianças e a «desgraça» do Comité Português da UNICEF

    No País mais siderado do Mundo com o que fizeram a um número incontável das suas Crianças, é legítimo o registo de que, no Palácio das Nações (Genebra) o Comité dos Direitos da Criança vai reunir de 15 de Setembro até 3 de Outubro. Não, não vai ser analisado por ora qualquer relatório sobre Portugal – as atenções vão para o que se passa em São Marino, Canadá, Nova Zelândia, Paquistão, Madagáscar, Brunei, Singapura, Bangladesh e Geórgia.

    Em todo o caso, vêm a propósito algumas anotações:

  • A Convenção dos Direitos da Criança foi ratificada por 192 países (Timor-Leste fê-lo no mês passado). Apenas os EUA e a Somália até agora não ratificaram a convenção.

  • Portugal, apenas em Maio deste ano ratificou o Protocolo Facultativo contra o Tráfico de Crianças e contra a Prostituição e Pornografia Infantis. Assinou o instrumento de Setembro de 2000 e levou três anos a ponderar.

  • Ainda Portugal, relativamente ao Protocolo Facultativo sobre o Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados que assinou também em 2000, continua todavia a ponderar a ratificação.

  • Pior se passa com Angola: não assinou qualquer dos protocolos e possivelmente nem pondera.

  • A completar, o site do Comité Português da UNICEF, instituição criada em 1979 e goza do estatuto de Associação de Utilidade Pública e de Organização não Governamental para o Desenvolvimento, não é actualizado desde 8 de Abril, pelo que não dá conta da ratificação portuguesa do Protocolo contra a Pornografia Infantil e muito menos do que se passa agora em Genebra. Em matéria de sites, outra «desgraça».
  • O caso do «rapto» do Director-Geral português em Bruxelas

    O título, à evidência, é apenas um chamariz: não houve qualquer «rapto» mas o Director-Geral português desapareceu da Comissão da União Europeia. Seguindo, por acto de excepção sediciosa, a moda pacóvia e provinciana, acrescentamos - «Saiba mais» mas daqui a uns dias, poucos. Há que ter paciência com o chamariz.

    Portugal e a Conferência do Desarmamento

    Terminou, em Genebra, a sessão de 2003 da Conferência do Desarmamento, mais uma vez sem resultados. Na única instância da comunidade internacional para negociações sobre esse sonho do desarmamento, o pesadelo do armamento continua a impor o impasse: nem sequer foi conseguido um «programa de trabalho» e muito menos reestabelecidos ou constituídos mecanismos para qualquer dos pontos inscritos na ordem de trabalhos. Em vez de negociações conclusivas, a conferência foi tão somente um teatro de animados debates e que, na gasta gíria diplomática, são traduzidos como «esforços construtivos». No contexto internacional, a sessão de 2003 ficou marcada pelas consequências do anúncio da Coreia do Norte sobre a sua retirada do Tratado Sobre a Não Proliferção de Armas Nucleares e pela guerra do Iraque. No termo da sessão plenária de 2003, outra coisa não poderia afirmar a presidência japonesa (Kuniko Inoguchi) da conferência a não ser que «a dinâmica actual do Mundo não é necessariamente favorável à paz global».
    E o que faz Portugal no meio disto? Lá participou nos trabalhos a título de observador e integra um grupo de 11 países (Áustria, França, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Polónia, Espanha, Inglaterra e EUA) subscritores da chamada «iniciativa contra a proliferação», em nome dos quais, a França solicitou que o documento fosse difundido pela Conferência como documento oficial.
    A primeira parte da sessão de 2004 começa a 20 de Janeiro, presidida pelo Quénia face à renúncia do Kazaquistão para tal função.

    10 setembro 2003

    Até final do ano, as Necessidades põem ordem no site...

    E dizem-me que, até final de 2003, o Ministério dos Negócios Estrangeiros terá «cara» lavada na Internet. E dizem-me que Martins da Cruz se empenhou particularmente pelo assunto. E dizem-me que a nova «cara» se não for a melhor do Mundo. será uma das melhores. E dizem-me que a questão dos endereços electrónicos de Representações, Missões Diplomáticas, Consulados e serviços centrais vão ser postos na ordem. E dizem-me que o Protocolo de Estado vai ser alvo de especial preocupação (reparem que o actual site, nem mesmo desactualizada, refere a Lista de Precedências dos embaixadores acreditados em Lisboa...) E dizem-me tanta coisa que fico a ver para crer. Mas até lá, o ministro Martins da Cruz deveria suspender pura e simplesmente a página oficial do MNE. Que um familiar de um emigrante na Venezuela tente, por exemplo, enviar correio electrónico para o Consulado-geral em Caracas...

    A propósito: já repararam que em todos os sites oficiais, desde Belém à junta de freguesia mais escondida, a «mensagem» do N.º Um, essa, é rapidamente actualizada, com a fotografia do «bem amado líder» em questão em pose de menino bem comportado e saído da missa? Ridículo, provinciano. Há sites próprios de embaixadas portuguesas em capitais estrangeiras que estão nesse nível. Lá chegaremos.

    A história do min-nestrangeiros.pt

    Observou Portugal e Arredores, e fez bem observar, que já tinha falado da história do MNE e portanto da lastimosa imagem que debita para a Internet. Naturalmente que o assunto não é novo e, muito antes de Deus interromper o seu descanso de sétimo dia criando a blogosfera neste oitavo, a matéria fora tratada em letra impressa. A nossa intenção, agora, foi apenas a de fazer um convite para se comparar o Palácio das Necessidades com alguns departamentos estrangeiros homólogos. Pelo teor do correio recebido, valeu a pena.

    Com isto, Portugal e Arredores entrou no nosso modesto Protocolo aqui ao lado, onde já nos sentíamos mal se não colocássemos na lista de precedências a Bloguítica Nacional e a Bloguítica Internacional pelas deferências justamente protocolares que nos têm dispensado. Pelas mesmas razões, Terras do Nunca entram bem.

    09 setembro 2003

    Palácio das Necessidades com «má cara» na Internet. Uma lástima!

    O site do Palácio das Necessidades é uma desgraça. O pior que pode acontecer no Século XXI é transplantar-se a velha, respeitável mas viva Tipografia para a Internet, sem tirar nem pôr. É um absurdo comunicar «um livro» na Internet, como absurdo será publicar os «conteúdos dinâmicos» da Internet num Livro. Cada coisa no seu lugar.

    O que faz o Palácio das Necessidades? Pura e simplesmente verte para a Internet o seu «Anuário Diplomático» que é tudo menos anuário pois cada «ano» para as Necessidades vale por cinco, sete ou dez. Desde os simples números de telefones, de fax e endereços postais até aos nome dos titulares de postos diplomáticos e endereços electrónicos de embaixadas, consulados e serviços centrais, estão em 85 por cento desactualizados; posições oficiais do Estado Português sobre os mais diversos assuntos, não são conultáveis (claro que motores de busca são inimigos da transparência); agendas da política externa, são desconhecidas... Uma lástima, onde contudo não falta «teoria» de ares acad~emicos, cronologia caduca, descrições de «competências» do director, do sub-director, do chefe e do sub-chefe como nas esquadras de polícia. Mentalidades.

    Sem grande custo, podem ir directamente ao México. E comparem com as Necessidades.

    Consultem agora o Brasil. Comparem.

    Vejam como o Chile faz. Continuem a comparar.

    Se ou quando tiverem tempo passem pela Argentina, pela França, pelo Reino Unido, pela Alemanha, pela Itália ou até mesmo pelos da porta aqui ao lado, os da intocável Espanha e tirem dúvidas com a Áustria.

    Mais ou menos estamos como Marrocos.

    Os colaboradores directos de Jaime Gama, apesar de sistematicamente alertados, foram incapazes de mudar radicalmente este estendal de incompetência das Necessidades, sabendo-se que, em todo o mundo, a imagem saída dos serviços diplomáticos centrais fixa a primeira e mais impressiva imagem do próprio País.

    Com Martins da Cruz, até agora, o panorama continua igual. E das duas uma: ou, com total discrição e para provocar surpresa geral, se prepara uma «revolução» no sistema e práticas de comunicação das Necessidades, ou então institucionalizou-se o desleixo e uma visão típica do subdesenvolvimento.

    Quando a vontade de perguntar é como a língua: não tem ossos...

    Vejam bem. Por entre 72 comentários enviados para a caixa de correio – a maior parte tratando-se de reflexões críticas com que se aprende embora o mundo, lá por isso, não avance – surgiram exactamente 14 provocações. Destas, 13 são baratas mas uma tem o preço de não ser ingénua e foi escrita com ares de desafio. Resolvo divulgá-la porque quem não deve não teme.


    6.9.03

    Caro "Notas Verbais"

    Verifico que é uma das personagens rendidas ao Ministro Martins da Cruz, embora espere que não esteja na conhecida "lista de pagamentos" e que não seja apenas um pseudónimo do Fernando Lima.

    Deve ser por essa razão que o seu pendor elogioso face às Necessidades não chega ao ponto de:

    - contar a história proibida da súbita saída de cena do Director-Geral de Política Externa do MNE, embaixador Silveira Carvalho;

    - colocar a lista de cessação de funções do pessoal técnico do MNE e a lista (e ligações político-pessoais) dos seus sucessores por esse mundo fora;

    - esclarecer sobre o estado miserável do quadro do pessoal administrativo de vários consulados, notar os protestos das Comunidades Portuguesas por tal estado de coisas e pelo encerramento de vários outros consulados;

    - perguntar onde está o cumprimento das tão anunciadas regras de poupanças em viagens do MNE e seus assessores. Sabia que o MNE levou um diplomata para o seu gabinete só para lhe tratar das viagens ? E seria possível apresentar uma lista das viagens dos MNE desde que tomou posse, com custos de passagens e ajudas de custo à frente ?

    - inquirir sobre as medidas concretas já tomadas no âmbito da Diplomacia Económica, com efeitos conseguidos.

    - e é possível saber onde e como tem sido gasto o "saco azul" do MNE, que dá pelo nome de Fundo para as Relações Internacionais (FRI) ?

    Se tiver coragem para responder a estas perguntas, dar-lhe-ei muitas outras para se entreter. Se não tiver essa coragem, então é porque já preencheu o formulário para se tornar no novo Director do Gabinete de Informação e Imprensa do MNE.

    Carlos Ribeiro



    A ver vamos.

    08 setembro 2003

    A questão de Olivença

    1 – Quando confrontados com a questão de Olivença, os reponsáveis pela política externa portuguesa têm sistematicamente respondido com o que é já um chavão, segundo fórmula exitosamente elaborada por Jaime Gama: «Olivença não está na agenda política nem na agenda diplomática». E quando a pergunta vai mais além, os mesmos responsáveis entram imediatamente no atalho onde as grandes causas se cruzam com os inevitáveis fantasmas da política externa portuguesa, e repetem também sistematicamente: «Não podemos pôr em causa o bom relacionamento com Espanha que é o interesse central da nossa política externa» pelo que o assunto de Olivença fica aparentemente encerrado com a dita explicação, insinuando-se, de resto, que quem toca na questão de Olivença estará a prejudicar um elevado interesse do Estado...

    2 – O argumento da «agenda» não é politica nem diplomaticamente sério e a ameaça de um suposto «papão» no relacionamento peninsular não tem solidez.

    3 – É um facto que a fronteira entre Portugal e Espanha, nos longos quilómetros que implicam o Território histórico de Olivença está por delinear e está por ser reconhecida reciprocamente. A linha fronteiriça é interrompida no marco N.º 801 sendo apenas retomada no marco N.º 900, e está interrompida porque a Espanha diz que é espanhol o que Portugal não aceita que alguma vez deixe de ser português. Até agora, as consequências da indefinição de fronteiras entre os dois Estados têm aflorado em episódios suficientemente pequenos para que, por si só, elevem a questão da «agenda» a questão de Estado. A indefinição, inexistência ou até, como é o caso, o não-reconhecimento de fronteiras de um Estado com o Estado vizinho, é obviamente tema imperativo da agenda política e devia ser tema obrigatório da agenda diplomática. O problema existe e, pela parte portuguesa, está constitucionalmente tutelado.

    4 – O governo de Madrid, por sua vez, tem ostentado um silêncio absoluto sobre a questão, não porque não o tenha na «agenda política», mas porque tem outros interesses na «agenda diplomática» e com os quais a questão de Olivença não se compagina. A argumentação de Madrid, por exemplo, para a questão de Gibraltar cairia por terra e entraria no campo das contradicções palavra por palavra, caso a Espanha, em consciência, se visse obrigada ou, mais longínquamente por assomo de honra, tomasse a inciativa de confrontar posições com Lisboa a propósito de Olivença. Pelo pavor de tais contradicções, Madrid tem-se silenciado no caso, preferindo reservar argumentos para o Reino Unido (na questão de Gibraltar) e para Marrocos (na questão dos enclaves espanhóis no Norte de África). Em relação a Portugal, a diploamcia madrilena limita-se a contar com que umas tantas autoridades regionais menores, como o presidente da Extremadura, por aí espalhem, como lhes é atribuido, que «com a União Europeia desapareceram as fronteiras».

    5 – O que está em causa? Na questão de Olivença, politicamente ou à cabeça, está em causa um território e apenas depois se poderá colocar a população. Possivelmente, para a questão de Gibraltar e para os enclaves espanhóis em Marrocos, território e população são elementos igualmente relevantes, pelo que Madrid foge de uma solução por referendo como o diabo da cruz. Os gibraltinos e os marroquinos, pelo que consta e se sabe, não querem ser espanhóis nem sequer em part-time. A questão de Olivença é uma questão de Território e não tanto de Oliventinos - se fosse feita um sondagem em Portugal sobre se se aceitaria os oliventinos como cidadãos portugueses, pouca gente os reconheceria, primeiro porque nada têm feito por isso, e, segundo, porque tudo têm feito contra isso. Com legitimidade, sublinhe-se porque são livres e oliventinos.

    6 – E como a questão é de Território e existe, está na «agenda política». Podem os ministros dizer e repetir que não está na «agenda diplomática», todavia é geralmente aceite como bom aviso que a agenda diplomatica assuma os items da agenda política. Valerá explicar porquê? Voltaremos ao assunto.

    05 setembro 2003

    Congresso dos Advogados e Política Internacional.

    Do 47.º Congresso da União Internacional dos Advogados (30 de Agosto a 3 de Setembro, em Lisboa, no CCB, com representantes de 75 países) pelo constou e não foi desmentido, saiu uma proposta no mínimo paradoxal: a da mudança da sede da ONU para um país neutral. Alguma imprensa chegou mesmo a titular que «Lisboa pode mudar a ONU», o que é também, no mínimo, paradoxal, pois não se sabe como a capital portuguesa poderá mudar a ONU quando esta se prepara para encerrar no final deste ano o modesto escritório que há décadas tem funcionado num andar das Picoas.

    Mudança de onde? De Nova Iorque, onde de facto estão ancorados os complexos sistemas do Secretariado da organização e e da Assembleia Geral? De Washington onde «reside» o grupo do Banco Mundial?Possivelmente, a proposta da UIA evitou a clareza de pedir a saída dos EUA e não apenas de Nova Iorque. No entanto, outro grande pilar do Sistema das Nações Unidas, designadamente o estratégico ECOSOC, está precisamente em Genebra, no gigantesco edifício onde funcionou a Sociedade das Nações e que igualmente dá domicílio a um verdadeiro enxame de organismos internacionais, agências e programas que gravitam em torno da ONU. Genebra está num país neutral, tão neutral que foi dos últimos a tornar-se membro da ONU quando a neutralidade já não convencia absolutamente ninguém.

    Evitemos repetir o que se sabe e que os advogados têm a obrigação de não desconhecer: para além de Nova Iorque, Washington e Genebra, os organismos, agências especializadas, programas e instituições da ONU têm as sedes espalhadas um pouco por todo o lado. Podem estar mal espalhadas, mas estão. Viena (outro pequeno enxame), Paris (UNESCO), Roma (FAO), Londres (OMI), Haia (Tribunal Internacional de Justiça e TPI), Hamburgo (Tribunal do Mar) por aí fora. Querem os advogados deste congresso mudar a ONU de onde para onde?

    Vamos então à questão do «país neutral». Querem que a ONU mude para a Suiça onde já está em parte e onde a Sociedade das Nações esteve por inteiro deixando aliás um legado de má memória? Para além do país dos cantões, em matéria de neutralidades restará a Santa Sé, não se vislumbrando, todavia que a ONU possa albergar-se na capela Sistina.

    É verdade que para além do fogacho da sede, os advogados abordaram a questão da reforma do sistema da ONU. Contudo nenhum dos problemas levantados e propostas feitas (reforma do Conselho de Segurança, questão do veto, relações entre Conselho e Assembleia Geral, financiamento e controlo orçamental da organização, enfim, a revisão da Carta) têm qualquer novidade e estão na agenda da organização mundial.

    O que é novo é que o presidente da União Internacional dos Advogados, o libanês Antoine Akl, ignore que o TPI não é um «tribunal penal das Nações Unidas», como afirmou no discurso inaugural do congresso perante Jorge Sampaio. Ignorar isso, vindo de um advogado de Beirute, e não explicar por que razão o Líbano não ratificou o Estatuto de Roma, é neutralidade em demasia.

    Moral do congresso: nem Lisboa mudou a ONU, nem mudaram os advogados em matéria de política internacional onde a regra de apoiar os clientes não resiste, como se tem visto quando essa regra é aplicada pelos leigos.

    04 setembro 2003

    Comparações ofensivas

    Jaime Gama, na parte final do seu longo consulado à frente das Necessidades (o somatório dos anos apenas foi suplantado por Andrade Corvo no Século XIX...) parece que fez tudo para acabar com os secretários de Estado, até ficar cercado de «directores-gerais» na Cooperação, nos Assuntos Europeus e nas Comunidades. O ministro perdeu politicamente com isso.

    Martins da Cruz não teve a sorte de Gama, não contando logo à partida com secretários de Estado a sério. Começou e continua com menos que «directores-gerais», ressalvando-se a relativa excepção dos Assuntos Europeus, onde Carlos Costa Neves ainda não deu provas do que, segundo consta, vale . A verdade é que os homens da Cooperação e das Comunidades não aguentam a pedalada do ministro que é uma das boas, grandes e inesperadas surpresas do governo de Durão Barroso. António Lourenço dos Santos e José de Almeida Cesário, política e diplomaticamente, não existem. Estariam bem a cercar a parte final de Jaime Gama que tanto ficou a dever aos bons secretários de Estado da sua fase incial (José Lamego, por exemplo, para se evocar a primeira limpeza). Martins da Cruz, nesta sua etapa inicial, mereceria secretários de Estado dinâmicos, com golpe de asa, com pensamento estruturado, enfim, com aquela sabedoria que faz inspirar confiança na política externa, qualidade que não se exige a chefes de divisão. Já é tarde para se acreditar em reabilitações e não falemos dos episódios.

    A Madrid, o que Lisboa deita fora...

    Jovens diplomatas timorenses e africanos (lusófonos) terminaram recentemente o curso de formação em Madrid. O Ministério das Relações Exteriores espanhol fez o que devia: Portugal (no tempo de Guterres e com essa enorme decepção que foi João Gomes Cravinho à frente do antigo Instituto da Cooperação Portuguesa ) cortou o apoio a essa actividade, tradicionalmente prosseguida pelo Instituto Diplomático das Necessidades. A última iniciativa nesta área foi entre Janeiro e Fevereiro de 2001, envolvendo a deslocação a Lisboa de 12 «futuros diplomatas timorenses», acção que decorreu no Centro de Caparide. Portugal - ou melhor essa pirâmide decisores Cravinho-Amado-Gama-Guterres - deixou cair a ideia, e a Espanha fez o que devia, obviamente. Não se queixem. Agora, parece que o ministro Martins da Cruz quer emendar o erro. E se Madrid duplicar o atractivo?